quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

TEMA DE REDAÇÃO: SEGURANÇA PÚBLICA

Nas últimas décadas, a questão da segurança pública passou a ser considerada problema fundamental e principal desafio ao estado de direito no Brasil. A segurança ganhou enorme visibilidade pública e jamais, em nossa história recente, esteve tão presente nos debates tanto de especialistas como do público em geral.
Os problemas relacionados com o aumento das taxas de criminalidade, o aumento da sensação de insegurança, sobretudo nos grandes centros urbanos, a degradação do espaço público, as dificuldades relacionadas à reforma das instituições da administração da justiça criminal, a violência policial, a ineficiência preventiva de nossas instituições, a superpopulação nos presídios, degradação das condições de internação de jovens em conflito com a lei, a corrupção, o aumento dos custos operacionais do sistema, os problemas relacionados à eficiência da investigação criminal e das perícias policiais e a morosidade judicial, entre tantos outros, representam desafios para o sucesso do processo de consolidação política da democracia no Brasil.
(http://www.observatoriodeseguranca.org/seguranca)


Com base nos seguintes textos motivadores a seguir e nos conhecimentos construídos ao longo de sua vida, redija um texto argumentativo-dissertativo em norma culta escrita da língua portuguesa sobre os problemas da segurança pública no Brasil. Procure analisar suas causas e apresentar experiências ou propostas de intervenção social.


1. Mais do que um tema presente e dominante em palanques e veículos de imprensa, a segurança pública é uma preocupação importante para a sociedade, chegando ao nível de influenciar condutas e costumes sociais, além de gerar implicações em outras áreas e ampliar problemas como a segregação social e o preconceito. Apesar dos discursos políticos e da preocupação (ou paranoia) social relacionada ao assunto, os dados sobre segurança pública mostram que as condições têm piorado ao longo dos anos. Segundo a pesquisa IDS 2010 (Indicadores de Desenvolvimento Sustentável), divulgada no início de setembro pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a taxa de homicídios no Brasil cresceu 32%, em 15 anos. Assim, o índice de mortes por 100 mil habitantes subiu de 19,2, em 1992, para 25,4, em 2007. (...) Pesquisadora do Núcleo de Estudos da Violência da USP, a socióloga Cristina Neme apresenta uma avaliação sobre a tendência de aumento na "preocupação coletiva" relacionada à segurança: "(...) Os crimes contra a pessoa são o grande fator de insegurança da população e representam o ápice das violências que afetam a sociedade em um contexto de grandes desigualdades sociais”. (...) Segundo o cientista político Álvaro Oxley Rocha, o Brasil sempre foi carente de políticas públicas para segurança. "Nossa formação social se deu pela construção dos interesses das nossas elites sociais, que se preocupavam, no máximo, em proteger seu patrimônio. Segurança coletiva nunca foi uma preocupação, quanto mais uma prioridade", avalia Rocha, professor da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. (...) A partir da compreensão de que as políticas públicas de segurança no Brasil carecem de fundamentação e se voltam principalmente para a proteção do patrimônio, é mais fácil entender também a construção do sistema penal. Segundo Gaio, a estrutura das polícias e dos demais instrumentos de segurança está voltada para a repressão. "A ênfase, de fato, é no trabalho repressivo. Política alguma pode funcionar se, na ponta, onde estão os policiais, não houver uma renovação completa". (...) No clássico "Vigiar e Punir", o filósofo Michel Foucault analisa as mudanças no tipo de punição aplicada às pessoas consideradas culpadas, com o progressivo desaparecimento dos suplícios entre o final do século 18 e início do 19. "Nessa transformação, misturaram-se dois processos. Não tiveram nem a mesma cronologia nem as mesmas razões de ser. De um lado, a supressão do espetáculo punitivo. O cerimonial da pena vai sendo obliterado e passa a ser apenas um novo ato de procedimento ou de administração. [...] O desaparecimento dos suplícios é, pois o espetáculo que se elimina; mas é também o domínio sobre o corpo que se extingue". Dessa forma, o autor chega a uma questão central de sua obra e cita o exemplo da guilhotina como máquina inventada para uniformizar as penas de morte em um procedimento sem dor. "Quase sem tocar o corpo, a guilhotina suprime a vida, tal como a prisão suprime a liberdade, ou uma multa tira os bens. Ela aplica a lei não tanto a um corpo real e susceptível de dor quanto a um sujeito jurídico, detentor, entre outros direitos, do de existir. Ela devia ter a abstração da própria lei". Para ele, a descoberta do corpo como objeto e alvo do poder, no século XVIII, deu início às tentativas de manipulação, treinamento e adequação, que possibilitaram o fortalecimento das instituições disciplinares, chamadas por Erving Goffman de "instituições totais" e definidas como "um local de residência e trabalho onde um grande número de indivíduos com situação semelhante, separado da sociedade mais ampla por considerável período de tempo, leva uma vida fechada e formalmente administrada". Segundo Goffman, qualquer grupo de pessoas enclausuradas nesses lugares desenvolve regras próprias que permitem o convívio. "Acreditava, e continuo a acreditar, que qualquer grupo de pessoas - prisioneiros, primitivos, pilotos ou pacientes - desenvolve uma vida própria que se torna significativa, razoável, e normal, desde que você se aproxime dela". Assim, as prisões são entendidas, ao menos teoricamente, tanto como locais de punição quanto de adequação e reinserção, de controle do corpo. Contudo, há que se pensar sobre as regras próprias criadas dentro dessas instituições para evidenciar se estão conseguindo o efeito esperado. Questão de saúde? Além das questões sociais ligadas à desigualdade, pobreza e exclusão, a problemática da violência passa também por um aspecto normalmente associado apenas às ciências da saúde: o consumo e a dependência de substâncias psicoativas, que podem ser consideradas um fator que, se não é o único responsável, facilita ou desencadeia comportamentos violentos que redundam em crimes como agressões e homicídios, entre outros. Divulgada em agosto de 2010, uma pesquisa coordenada pelo professor de Sociologia da PUC-MG, Luis Flavio Sapori, mostrou que, dez anos após a chegada do crack em Belo Horizonte, a proporção de homicídios motivados por questões ligadas a drogas ilícitas quadruplicou. Se até 1996, quando a droga era dificilmente encontrada na cidade, as mortes provocadas por conflitos que envolviam drogas representavam 8,3% do total, em 2006 esse número foi para 33,3%. Assim, apesar da redução nos números gerais de homicídios, houve crescimento absoluto do número de mortes motivadas pelo crack. Outra experiência com dados interessantes sobre a relação entre violência e consumo de substâncias que afetam o sistema nervoso central aconteceu na cidade de Diadema, na Grande São Paulo. Conhecido por altos índices de violência e criminalidade, o município implantou em julho de 2002 uma lei que regulou a abertura de bares entre 23h e 6h. Desde então, foram evitados 11 homicídios por mês, segundo levantamento da Universidade Federal de São Paulo. O caso foi apresentado como exemplo positivo em um congresso da ONU em 2005. Segundo os especialistas da área, todas as drogas podem gerar dependência química, doença que se instala no sistema nervoso central e que precisa de tratamento especializado. Caso contrário, a pessoa que desenvolveu a patologia perde progressivamente a possibilidade de autodeterminação e fica exposta a um comportamento mais agressivo do que o habitualmente apresentado. (...) Como formas de qualificar a gestão e deixar a atuação apenas repressora das polícias, duas propostas são amplamente discutidas pela sociedade, mas talvez sem análises suficientemente aprofundadas sobre suas possibilidades práticas nas diversas realidades do Brasil. Para melhorar a gestão, fala-se em unificação das polícias civil e militar; para sair da postura de repressão e proteção patrimonial, algumas ideias são reunidas sob o conceito genérico de "polícia comunitária", que inclui estratégias de aproximação entre as forças policiais e as classes sociais tradicionalmente condicionadas a sentir-se ameaçadas por elas. Esse tipo e ação é elogiada pelo professor da PUCRS. "Em um primeiro momento, a aproximação das forças policiais da comunidade, funciona como paliativo para promover a cidadania, ao integrar comunidades abandonadas, na verdade nunca assumidas, como parte do Estado. É uma iniciativa válida e, começando por ela, pode-se ir muito longe", analisa Álvaro Oxley Rocha. Por sua vez, o professor André Gaio é cético com relação ao tema. "A polícia comunitária não existe. Dificilmente haverá polícia próxima da comunidade. A lei de responsabilidade fiscal, inclusive, está determinando que as cidades pequenas tenham que arcar com os custos do policiamento. Em futuro próximo apenas haverá efetivo policial (civil e militar) para cidades médias e grandes". De certa forma, a opinião de Rocha é complementar ao pessimismo do colega. "A população precisa ser educada para conviver com os agentes do Estado, mas os agentes do Estado, no Brasil, também precisam ser educados para a realização do bem comum, a que se destina o dinheiro público. Se for abandonada à própria sorte, como costuma acontecer entre nós, mesmo iniciativas louváveis como essa serão tragadas pela corrupção, que resulta da falta das políticas de educação e de renda", declara. Sobre a unificação das polícias, os especialistas têm avaliação parecida. Para Oxley Rocha, "a irracionalidade administrativa brasileira se manifesta de muitas maneiras, uma delas é a sobreposição de funções públicas, como no caso de duas polícias, além das Polícias internas das Forças Armadas, e Polícias Municipais". Por sua vez, André Gaio acredita que a proposta tem motivações de ordem técnico-administrativa e operacional, "mas dificilmente encontramos lugares em que funcione um trabalho coordenado entre as duas polícias. As rivalidades entre as mesmas ainda são insuperáveis e o trabalho de ambas, com raras exceções, são muito ruins".
(Insegurança pública – Danilo Maeda - http://portalcienciaevida.uol.com.br/ESSO/edicoes/31/artigo188826-1.asp?o=r)

2. Em entrevista ao programa Roda Viva (veja íntegra na web), da TV Cultura, que vai ao ar nesta segunda-feira (29/11), logo mais, às 22h, o antropólogo e escritor Luiz Eduardo Soares, ex-secretário Nacional de Segurança Pública do Rio de Janeiro, afirma que não se pode cantar a vitória como se a questão do tráfico e do crime organizado no Rio de Janeiro estivesse solucionada. “O problema é o triunfalismo, é a forma pela qual se começa a divulgar a ideia de que vencemos o crime. Vencemos quem, cara pálida? Hoje nós tomamos sim aquele território, mas estamos deixando de lado a preocupação do crime organizado, centrado nas instituições policiais”. Entretanto, Soares aponta fatores positivos na operação: “Nós não tivemos um banho de sangue. Tivemos atenção, cautela e prudência nessa operação. Nas outras vezes houver a articulação entre o Estadual, a União, as instituições das forças armadas, as polícias, mas de um modo muito precário, com muitas disputas políticas nos bastidores. Dessa vez, de fato houve uma integração maior”, afirma. Sobre a questão da corrupção nas milícias no Rio de Janeiro, fato abordado no filme Tropa de Elite 2, inspirado no livro Elite da Tropa 2, do qual é co-autor, ele diz que: “O trafico foi patrocinado, foi protegido e depois de um espírito empreendedorista, que tem sido mais a marca da corrupção nos últimos anos, o tráfico tem sido inclusive superado pelas milícias. Temos de fato uma organização orgânica entre as formas mais perigosas do crime e estes segmentos policiais”. E completa: “Digo isso com muito cuidado, com tristeza porque não quero ofender nem as instituições nem as dezenas de profissionais honrados que estão arriscando sua vida, não só agora, mas no cotidiano, por salários indignos, porque o estado do Rio de Janeiro paga um dos piores salários do País a despeito da gravidade do problema que enfrentamos. Eles são humilhados, acuados, covardemente chantageados”. Ele ainda afirma que “os policiais são os primeiros a reconhecer que não temem os bandidos, de modo algum, mas eles temem seus colegas, quando eles se mostram perigosos criminosos, porque estes sabem onde eles moram, conhecem suas famílias e são mais articulados, têm mais formação técnica e profissional do que os garotos que nunca saíram da favela”. Ao ser questionado por que não havia tido uma operação desse porte no Rio, ele foi enfático: “Foi feito várias vezes. Nós tivemos no passado situações análogas, mas é claro que agora eu vejo mais condições. Nós tivemos a Operação Rio de 1994 para 95”.
(http://www.tvcultura.com.br/conteudo/32045)

3. (a) O que fazer, já, imediatamente, para sustar a violência e resolver o desafio da insegurança? Nada que se possa fazer já, imediatamente, resolverá a insegurança. Quando se está na crise, usam-se os instrumentos disponíveis e os procedimentos conhecidos para conter os sintomas e salvar o paciente. Se desejamos, de fato, resolver algum problema grave, não é possível continuar a tratar o paciente apenas quando ele já está na UTI, tomado por uma enfermidade letal, apresentando um quadro agudo. Nessa hora, parte-se para medidas extremas, de desespero, mobilizando-se o canivete e o açougueiro, sem anestesia e assepsia. Nessa hora, o cardiologista abre o tórax do moribundo na maca, no corredor. Não há como construir um novo hospital, decente, eficiente, nem para formar especialistas, nem para prevenir epidemias, nem para adotar procedimentos que evitem o agravamento da patologia. Por isso, o primeiro passo para evitar que a situação se repita é trocar a pergunta. O foco capaz de ajudar a mudar a realidade é aquele apontado por outra pergunta: o que fazer para aperfeiçoar a segurança pública, no Rio e no Brasil, evitando a violência de todos os dias, assim como sua intensificação, expressa nas sucessivas crises? A melhor resposta à emergência é começar a se movimentar na direção da reconstrução das condições geradoras da situação emergencial. Quanto ao imediato, não há espaço para nada senão o disponível, acessível, conhecido, que se aplica com maior ou menor destreza, reduzindo-se danos e prolongando-se a vida em risco.
(b) O que as polícias fluminenses deveriam fazer para vencer, definitivamente, o tráfico de drogas? Em primeiro lugar, deveriam parar de traficar e de associar-se aos traficantes, nos “arregos” celebrados por suas bandas podres, à luz do dia, diante de todos. Deveriam parar de negociar armas com traficantes, o que as bandas podres fazem, sistematicamente. Deveriam também parar de reproduzir o pior do tráfico, dominando, sob a forma de máfias ou milícias, territórios e populações pela força das armas, visando rendimentos criminosos obtidos por meios cruéis.Ou seja, a polaridade referida na pergunta (polícias versus tráfico) esconde o verdadeiro problema: não existe a polaridade. Construí-la –isto é, separar bandido e polícia; distinguir crime e polícia-- teria de ser a meta mais importante e urgente de qualquer política de segurança digna desse nome. Não há nenhuma modalidade importante de ação criminal no Rio de que segmentos policiais corruptos estejam ausentes. E só por isso que ainda existe tráfico armado, assim como as milícias. Não digo isso para ofender os policiais ou as instituições. Não generalizo. Pelo contrário, sei que há dezenas de milhares de policiais honrados e honestos, que arriscam, estóica e heroicamente, suas vidas por salários indignos. Considero-os as primeiras vítimas da degradação institucional em curso, porque os envergonha, os humilha, os ameaça e acua o convívio inevitável com milhares de colegas corrompidos, envolvidos na criminalidade, sócios ou mesmo empreendedores do crime.
(...) O Jornal Nacional, nesta quinta, 25 de novembro, definiu o caos no Rio de Janeiro, salpicado de cenas de guerra e morte, pânico e desespero, como um dia histórico de vitória: o dia em que as polícias ocuparam a Vila Cruzeiro. Ou eu sofri um súbito apagão mental e me tornei um idiota contumaz e incorrigível ou os editores do JN sentiram-se autorizados a tratar milhões de telespectadores como contumazes e incorrigíveis idiotas.Ou se começa a falar sério e levar a sério a tragédia da insegurança pública no Brasil, ou será pelo menos mais digno furtar-se a fazer coro à farsa. (A crise no Rio e o pastiche midiático – Luis Eduardo Soares. 25/11/2010. ( http://luizeduardosoares.blogspot.com/2010/11/crise-no-rio-e-o-pastiche-midiatico.html)

4. Clara passeava no jardim com as crianças. / O céu era verde sobre o gramado, / a água era dourada sob as pontes, / outros elementos eram azuis, róseos, alaranjados, / o guarda civil sorria, passavam bicicletas, / a menina pisou a relva para pegar um pássaro, / o mundo inteiro, a Alemanha, a China, tudo era tranqüilo em redor de Clara. / As crianças olhavam para o céu: não era proibido. / A boca, o nariz, os olhos estavam abertos. Não havia perigo. / Os perigos que Clara temia eram a gripe, o calor, os insetos. / Clara tinha medo de perder o bonde das onze horas, / esperava cartas que custavam a chegar, / nem sempre podia usar vestido novo. Mas passeava no jardim, pela manhã!!! / havia jardins, havia manhãs naquele tempo!!! (Lembranças do mundo antigo. Carlos Drummond de Andrade)