quinta-feira, 30 de maio de 2013

DISCUSSÃO SOBRE COTAS


 “Cotas não atacam a raiz do problema”, diz Manuela Carneiro da Cunha


Antropóloga fala sobre “Negros, Estrangeiros” e diz que principal problema da educação é o ensino básico


HELDER FERREIRA

Professora emérita da Universidade de Chicago e uma das principais antropólogas brasileiras, Manuela Carneiro da Cunha, 69, está relançando Negros, Estrangeiros. Publicado originalmente em 1985, o livro traça, em sua primeira parte, um retrato estarrecedor do Estado escravocrata brasileiro do século 19 que, atemorizado com os trâmites que culminariam na Lei Áurea, passa a adotar uma política discriminatória e repressiva contra os negros, constrangendo-os a imigrarem para seus países natais no continente africano. Depois, remonta o destino dos ex-escravos imigrantes que se estabeleceram na cidade de Lagos, na Nigéria, e acabaram por formar uma burguesia local, adotando a nacionalidade do país que os rejeitou.

Ex-presidente da Associação Brasileira de Antropologia, Carneiro da Cunha é muito conhecida por seus estudos relacionados às questões indígenas brasileiras – como a coletânea Histórias dos Índios do Brasil (Companhia das Letras, 1992). Orientanda de Lévi-Strauss no início da carreira, ela dirige hoje no Cebrap (Centro Brasileiro da Análise e Planejamento) um projeto que estuda os efeitos das políticas culturais de patrimonialização nas populações tradicionais.

Em entrevista à CULT, Carneiro da Cunha defende as cotas em universidades públicas.

CULT – Negros, Estrangeiros narra a história de ex-escravos que reconstruíram suas vidas ao retornarem para a África, onde transformaram-se em membros da burguesia local. Por que este tipo de ascensão não foi possível no Brasil da época?

Manuela Carneiro da Cunha – No Brasil, negro, até prova em contrário, era necessariamente escravo. Os alforriados tinham de ter o máximo cuidado para não serem tomados por escravos fujões e escravizados de novo. Por isso evitavam sair da região onde eram conhecidos e alguns acabavam por se acomodar e se tornavam clientes, agregados, de seus antigos donos. Outros tentavam se estabelecer por conta própria no sertão.

Os trabalhadores forros urbanos não conseguiam competir com os senhores que queriam reservar certos mercados de trabalho para seus escravos: foi assim que os libertos foram alijados e impedidos de trabalhar no porto de Salvador. Não havia condições para uma ascensão social e financeira como aquela que se verificou na costa da África Ocidental.

Há semelhanças, quanto ao processo, entre os ex-escravos que retornaram à África e os imigrantes que vieram para o Brasil e depois voltaram a seus países de origem?

Há dessemelhanças: em geral, os imigrantes que voltaram para seus países de origem emigraram e voltaram por vontade própria. Não foi o caso dos africanos, que não só vieram forçados como voltaram deportados ou impelidos por uma política de expulsão.

Outra grande diferença é que os imigrantes geralmente voltam ricos. No caso dos africanos, ficaram ricos depois de voltar.

Mas há também semelhanças: os retornados, em geral, eram tidos por quase estrangeiros em seus países de origem e costumavam gostar de se distinguir da população local. Assim, os chamados “brasileiros” no norte de Portugal no século XIX eram os portugueses que haviam feito fortuna no Brasil e se aposentavam lá; hoje foram substituídos pelos “franceses”, os portugueses que haviam emigrado para França nos anos 1960. Os “brasileiros” se diferenciavam com araucárias diante de suas casas; os “franceses” hoje desfiguraram o norte de Portugal com pavilhões de estilo francês e telhas de ardósia.

As políticas de repressão contra os negros aplicadas pelo Estado no século XIX ainda hoje influenciam seus descendentes?

Certamente não ajudaram em nada a promover igualdade e a justiça para seus descendentes. Mas o que realmente cabe entender são as condições atuais. É nessas que podemos influir e são elas as que podem mudar o futuro.

O Legislativo acaba de aprovar cotas de 50% nas universidades federais para alunos oriundos de escolas públicas, sendo que, dentro desse percentual, serão priorizados estudantes negros, indígenas e/ou de baixa renda. A senhora acredita que as cotas raciais em universidades públicas brasileiras são necessárias? Há quem diga que as cotas sejam uma forma de discriminação racial ao contrário. A senhora concorda?

“Discriminação ao contrário” é uma contradição em termos. A discriminação sempre é exercida contra os mais fracos, não contra os mais fortes. Cotas para estudantes de baixa renda e para negros e índios chamaram a atenção para as disparidades enormes deste nosso país desigual. A UERJ, que foi a primeira universidade a implantá-las, já mostrou que o desempenho dos “cotistas” é equivalente ao dos outros estudantes.

Nesse sentido, as cotas são boas, mas incompletas. Em primeiro lugar, não incluem bolsas para que o estudante se mantenha: isso faz com que os mais pobres não possam, por exemplo, cursar medicina, que exige tempo integral. A evasão torna-se um problema.

Em segundo, não atacam a raiz do problema, que é a qualidade insuficiente do ensino público fundamental e médio. Isso resultou numa perversa distorção: as melhores universidades são públicas, gratuitas, mas nelas só conseguem entrar os egressos do ensino médio pago. Lembro que até a década de 1960 o ensino público era considerado melhor do que o privado.

O que senhora pensa sobre o retrato do negro traçado pela mídia no Brasil? Ele é muito diferente do que é feito nos EUA?

Muitíssimo diferente. Nos EUA, há um cuidado exagerado (a nosso ver) com a correção política na representação do negro. As pessoas pisam em ovos o tempo todo. Desde os anos 1970, há separação até na audiência que se espera: donde o gênero de filmes e seriados cunhado blacksploitation”, dirigidos especificamente à classe média urbana negra.

O contraste com o Brasil é enorme: acabo de ler Cidade de Deus, de Paulo Lins. Há um parágrafo lá que é antológico, mas que não vou conseguir achar agora: mostra a ausência da figura do negro na mídia, no livro escolar e na indústria de entretenimento no Brasil. O parágrafo termina com “até o vovô-viu-a-uva é branco”.

Em sua opinião, qual é a relevância atual de Negros, Estrangeiros?

A relevância é, a meu ver, historiográfica, mas também teórica. Quer fornecer aos descendentes de africanos um pouco de sua história, mostrar como foi penosa a passagem da escravidão para a liberdade e como foi difícil o Estado brasileiro aceitar a presença de negros que não fossem mais escravos como parte da nação que então se construía. Sua contribuição, creio, é levantar o véu sobre a auto-imagem complacente que o senso comum brasileiro cultiva.

Ainda como contribuição historiográfica, mostra a constituição de uma das primeiras burguesias coloniais aliadas ao colonialismo que pipocaram por todo o mundo no século XIX.

Por outro lado, o livro analisa, a partir do caso dos “brasileiros” na costa ocidental da África no século XIX, como se constrói uma identidade étnica. Nesse sentido, tem uma ambição teórica que extrapola esse caso, na medida que advoga que qualquer identidade étnica se define em relação a outras identidades étnicas: é uma abordagem estrutural da etnicidade.

Por fim, tenho orgulho da pesquisa iconográfica que ilustra o livro.



TEXTO 2

ALAI, América Latina en Movimiento

2011-05-05

Brasil

Por quê as cotas são uma proposta mais igualitarista que a eqüidade meritocrática?

Valerio Arcary



Se se entende que toda transgressão contra a propriedade, sem entrar em distinções, é um roubo, não será um roubo toda a propriedade privada? Acaso minha propriedade privada não exclui a todo terceiro desta propriedade? Não lesiono com isso, portanto, seu direito de propriedade? [1][1]
Karl Marx
O limite político do liberalismo foi a igualdade jurídica dos cidadãos. Os cidadãos seriam iguais diante da lei. A igualdade possível seria a eqüidade. O ponto de partida do marxismo foi a crítica do capital, portanto, do direito à propriedade privada. A liberdade não seria possível entre desiguais. Os marxistas lutam pela eqüidade, mas, seu projeto é a igualdade social. A discussão das cotas abriu uma polêmica, alguns defendendo o princípio meritocrático, e outros defendendo as políticas afirmativas. As cotas sociais e raciais no ensino superior ou nos concursos públicos são reformas que, sob o capitalismo, não poderão inverter a dinâmica decadente do capitalismo periférico. Mas, como o aumento dos salários ou a estabilidade no emprego, a reforma agrária ou a vinculação de verbas no orçamento do Estado para a educação e a saúde pública, é uma reforma progressiva.
Iguais e diversos
Remetendo as formas econômicas da organização social contemporânea às características de uma natureza humana invariável – o homem como lobo do homem - o liberalismo fundamentava a justificação do capitalismo na desigualdade natural. O marxismo percebia que os homens eram, ao mesmo tempo, iguais e desiguais. Reconhecia que a humanidade era diversa, os seres humanos possuindo capacidades e talentos variáveis, sublinhando, porém, que as necessidades mais intensamente sentidas eram iguais. Mais ou menos capazes todos os seres humanos compartilharam uma experiência comum: a necessidade de alimentação, vestimenta, abrigo, aprendizagem, segurança e diversão foram iguais para todos. 
O programa socialista inscreveu na História a necessidade da luta contra a propriedade privada para defender o direito à vida. A universalização dos direitos sociais remete ao cerne do projeto socialista: a luta pela liberdade humana, em que o trabalho deixe de ser um castigo para os explorados, e passe a ser a plena realização do potencial criativo de busca de conhecimento, beleza e solidariedade. Essa deve ser a missão fundamental da vida civilizada, e é o sentido da história pelo qual vale a pena lutar.
A luta contra as opressões é indivisível da luta contra a exploração
Os marxistas insistem na centralidade da luta contra a exploração, mas não ignoram o racismo e o machismo. Reconhecem a legitimidade das lutas contra a opressão. O argumento dos que defendem a igualdade de oportunidades contra as cotas aceita o limite da igualdade burguesa.  A eqüidade é o limite do liberalismo. O socialismo quer igualitarismo. A sociedade burguesa histórica nunca pôde realizar a igualdade jurídica. Em país algum os cidadãos são iguais diante da lei, porque os donos do capital podem mais. Ser branco pobre no Brasil nunca foi, também, o mesmo que ser negro pobre. A igualdade de oportunidades não pode corrigir estas desigualdades. Apresentar aos trabalhadores negros o mesmo programa que se apresenta aos trabalhadores brancos significa ignorar sua condição.
O marxismo defendeu que a passagem a uma sociedade socialista deveria ser compreendida pelo critério de distribuição de “cada um segundo suas capacidades, a cada um segundo suas necessidades”, construído pela socialização da propriedade. Seu objetivo é a gratuidade da alimentação, da educação, da saúde, dos transportes ou do lazer. A distribuição segundo a satisfação das necessidades exigirá, portanto, ir além do regime do trabalho assalariado. Os marxistas nunca se iludiram, todavia, que este princípio organizador da distribuição pudesse ser implantado imediatamente, ou à escala de um só país.
Tratar os desiguais como iguais perpetua a desigualdade
O marxismo propôs como princípio de distribuição para uma sociedade de transição “de cada um segundo sua capacidade, a cada um segundo o trabalho realizado”. Não defendeu salários iguais para trabalhos desiguais. Mas, a eqüidade é ainda uma igualdade formal. Nas palavras de Marx:
Este direito igual continua levando implícita uma limitação burguesa. O direito dos produtores é proporcional ao trabalho que produziram; a igualdade aqui consiste em que se mede pela mesma medida: pelo trabalho. Mas, uns indivíduos são superiores física e intelectualmente a outros e produzem no mesmo tempo mais trabalho, ou podem trabalhar mais tempo(...) Este direito igual, é um direito desigual para trabalho desigual(...) Para evitar estes inconvenientes, o direito teria que ser não igual, mas desigual [2][2].
Ao reconhecer que a distribuição seria regulada segundo o trabalho realizado, os marxistas estavam admitindo uma distribuição desigual, transitoriamente, o que é o mesmo que aceitar algum critério de racionamento. Os socialistas reconheceram que a diminuição da desigualdade social impulsionada pelo princípio de distribuição meritocrático – a tirania do esforço ou do talento – não garantiria ainda a igualdade social, porque estaríamos diante de um tratamento igual para os desiguais, perpetuando-a. Trabalhos diferentes, pela complexidade da educação exigida, ou pela intensidade do desgaste ou ainda do perigo, não poderiam ter salários iguais. Aceitaram a necessidade de seleção para o acesso às melhores oportunidades. Descartaram o sorteio porque seria ainda pior, premiando o acaso.
A igualdade social é, contudo, um objetivo superior à igualdade de oportunidades. A meritocracia considera de forma igual os desiguais. Os socialistas defendem que, em uma sociedade desigual, para que se diminuam as diferenças sociais, não bastaria a eqüidade: seria necessária tratar de forma desigual os desiguais. Essa é a defesa de Lênin: “Mas isto não é, todavia, o comunismo, não suprime ainda o direito burguês, que dá uma quantidade igual de produtos a homens que não são iguais, e por uma quantidade desigual de trabalho”[3][3].]
Os marxistas admitiram a introdução de fatores de correção social e, culturalmente, progressivos. Essa discussão surgiu a propósito das reivindicações das mulheres e das nações oprimidas, mas o critério é o mesmo quando discutimos o racismo.
Cotas são justas, porém, insuficientes!
As cotas do Governo Lula são um bombom em um bolo envenenado: a reforma universitária que legaliza a transferência de verbas públicas para o ensino privado, através do Prouni, anistiando as dívidas fiscais de um setor que estima faturar dezenas de bilhões de reais nos próximos anos. Sabemos, no entanto, que os inscritos no vestibular de acesso às universidades públicas têm somente igualdade de condições formais, portanto, abstratas, porque a seleção será decidida favorecendo os que tiveram melhores condições de preparação. Entre os mais desfavorecidos estão os negros.
As políticas afirmativas de cotas de acesso para afro-descendentes corrigem, parcialmente, um obstáculo que só é invisível para os que secundarizam o racismo. Opor às cotas a bandeira do acesso livre para todos é um argumento que impressiona, mas é ingênuo. O ensino de qualidade significa a desmercantilização de uma das necessidades humanas mais sentidas. Em nenhum dos processos revolucionários do século XX foi possível garantir acesso irrestrito ao ensino superior para todos, muito menos em qualquer curso. O argumento de que, ao invés das cotas, dever-se-ia garantir educação de qualidade universal desde a escola primária pode parecer um argumento razoável, mas não é. É reacionário. Não se pode pedir justiça ao futuro, sacrificando a justiça no presente: por quê a juventude negra deveria aguardar que os seus filhos, talvez, daqui a vinte anos, possam ter acesso ao ensino superior gratuito? Essa posição afasta o movimento negro da causa socialista.
O que se está defendendo contra as cotas, portanto, não é acesso universal, mas um critério de seleção, o meritocrático. Este critério é mais justo do que o racionamento pelo preço das mensalidades – a seleção determinada pelas diferenças de classe – mas, isso não faz dele um critério igualitarista. Igualitarista é tratar de forma desigual os desiguais, favorecendo os mais explorados ou oprimidos. Os defensores da meritocracia estrita propõem à juventude operária e negra que estudem mais, e tentem o vestibular outra vez. A eqüidade é socialmente regressiva. O seu resultado será o isolamento político-social dos que defendem as Universidades públicas, como a USP, as Federais e os CEFET’s, beneficiando a campanha pela cobrança de mensalidades e, finalmente, a privatização.
Ignorar a condição oprimida específica da população negra, em nome de um programa comum de todos os trabalhadores contra o capital, não vai construir a unidade da classe trabalhadora, mas a sua divisão. O racismo no Brasil não é uma invenção dos líderes dos movimentos negros. As políticas de cotas são insuficientes, porque não podem mudar, substancialmente, a condição do negro sob o capitalismo. A juventude negra só terá um futuro melhor se unir sua luta com toda a juventude trabalhadora. A libertação dos negros só será possível com a libertação do povo brasileiro.
notas:
[1][1] MARX, Karl, Os debates na Dieta Renana sobre as leis castigando os roubos de lenha, in Escritos de Juventud, México, Fondo de Cultura Econômica, 1987, p.251.
[2][2] MARX, Karl, Crítica do programa de Gotha, Lisboa, Nosso Tempo, 1971, p.31-32.
[3][3] LENIN, Vladimir, El Estado y la revolución, in Obras Escojidas en tres tomos, Moscou, Progresso, 1960. p.371. Tradução nossa.
Valerio Arcary, historiador, professor do CEFET/SP, e do conselho da revista Outubro.


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TEXTO 3


Tortuosos caminhos

César Benjamim

Aproveitando o ano eleitoral, o presidente Fernando Henrique anunciou o apoio do governo federal a um conjunto de medidas politicamente corretas, com destaque para o reconhecimento civil da união de pessoas de mesmo sexo e a reserva, para negros, de 20 por cento das vagas no serviço público. A primeira medida, proposta há alguns anos pela então deputada Marta Suplicy, é um avanço: duas pessoas adultas podem decidir quem desejam amar e com quem vão viver, e qualquer união estável deve ser geradora de direitos, respeitando-se a vontade expressa por ambas as partes. A mesma clareza não se aplica, a meu ver, à segunda medida, também defendida por grande parte da esquerda. É que o combate ao racismo freqüentemente envereda por tortuosos caminhos.

A construção do conceito de "raças humanas" foi o empreendimento mais importante da ciência européia no século 19. Nessa época, uma parafernália de métodos estatísticos e de sistemas de medição de cada parte do corpo lançou as bases de uma antropologia física que tentou classificar os grandes grupos humanos, estabelecendo correlações entre características aparentes e aptidões. O trabalho consumiu décadas, envolveu cientistas prestigiosos e produziu grande quantidade de resultados numéricos aparentemente
respeitáveis, com suas respectivas interpretações. O sentido desse esforço era óbvio. Ele visava estabelecer bases biológicas que legitimassem a expansão colonial das potências européias, então em pleno vapor. O
colonialismo passava a ser uma expressão da supremacia natural de povos mais aptos.

No século 20, com o desenvolvimento da genética e da biologia molecular, o estudo do corpo humano ultrapassou largamente os aspectos morfológicos mais aparentes, como a cor da pele, que serviram de base para as classificações anteriores. Passamos a comparar os organismos a partir do conhecimento de estruturas muito mais íntimas e mais fundamentais. Os resultados demoliram as bases conceituais das pesquisas anteriores. Ficou demonstrado que, ao longo da evolução, os grupos humanos conservaram uma semelhança espantosa; compartilham a mesma herança, com variações insignificantes.

As diferenças genéticas que se encontram entre duas pessoas escolhidas aleatoriamente em um mesmo grupo (dois nigerianos, por exemplo) não diferem estatisticamente das diferenças existentes entre duas pessoas de distintos grupos (um nigeriano e um sueco, por exemplo). Do ponto de vista genético e
bioquímico não se descobriu nenhum critério válido para juntar e separar as pessoas. Criou-se um consenso de que as diferenças observáveis na linguagem, nos costumes, nos valores, nos atributos morais, nas atitudes estéticas etc. não são biologicamente determinadas.

Desde então, o conceito de "raças humanas" foi remetido ao museu onde estão expostas à galhofa as afirmações de que a Terra é plana, de que habitamos o centro do universo, de que os corpos graves tendem ao repouso e outras idéias que (des)organizaram o pensamento da humanidade ao longo da história. Afirmou-se, em seu lugar, a unidade essencial da nossa espécie. É claro que isso não esgota o problema. Pois, apesar de cientificamente inepto - por não corresponder a nada que exista no mundo biológico -, aquele conceito continua a existir como fato ideológico e cultural. Creio que pelo menos continua a perambular pelo mundo.

O primeiro: a classificação de grupos humanos tendo como base a cor da pele (e outros atributos associados, como a forma do cabelo) é visível aos olhos e, como tal, "evidente". Brancos são brancos e negros são negros. Porém, há muito tempo a ciência aprendeu a desconfiar de "evidências". Também não é
"evidente" que o Sol gira em torno da Terra? Não é "evidente" que a Terra é plana? O processo de conhecimento é sempre a superação de "evidências". O mesmo ocorreu neste caso. O que determina a cor de uma pessoa é a quantidade de uma proteína, chamada melanina, que todos temos na pele. Assim, quando usamos a cor da pele como critério de classificação, estamos afirmando que as pessoas devem ser agrupadas e separadas conforme a quantidade de melanina que produzem. Mas a melanina é apenas uma das 80.000 ou 100.000 diferentes proteínas que compõem nosso corpo. Surge a questão: por que ela, e não outra proteína qualquer, deve ser usada como referência?

Seguindo essa trilha, a ciência contemporânea obteve resultados surpreendentes. Se usarmos a melanina como critério classificador, os suecos Johansson e Peter pertencerão a uma "raça", enquanto os nigerianos Kumbere e Tongo pertencerão a outra. Mas, se usarmos outra proteína qualquer, nada impede que Johansson e Kumbere integrem a mesma "raça", pela semelhança de sua composição bioquímica nesse aspecto, enquanto Peter e Tongo integrem uma outra. O mesmo procedimento pode se repetir quantas vezes se desejar, gerando infinitos rearranjos quando se considera a humanidade como um todo. Havendo uma infinidade de "raças" possíveis, é claro que não há "raça" nenhuma.

Um segundo motivo para a sobrevivência ideológica desse conceito é que tal classificação, como outras, corresponde a interesses. Pois o ato de classificar é também, necessariamente, um ato de hierarquizar: o grupo que inventa a classificação ocupa, invariavelmente, o topo da escala. (Nenhuma classificação reflete "o real"; todas são invenções, mais úteis ou menos úteis.)

O terceiro motivo é um pouco chocante: a idéia de que existam raças humanas, dotadas de diferentes aptidões, não contraria nenhuma lei da biologia. Portanto, não é absurda. Quando populações de uma mesma espécie se separam no espaço e se reproduzem isoladas ao longo de muitas gerações, elas tendem
a acumular diferenças, que podem se inscrever em seus códigos genéticos e, no longo prazo, resultar em raças diferentes. Isso ocorreu em muitas espécies animais (pastores alemães e pequineses são diferentes raças de cães de uma mesma espécie) e também começou a ocorrer na espécie humana.

A partir de um contingente originário da África, o Homo sapiens se espalhou pelo mundo, e seus subgrupos começaram a acumular diferenças. Se o isolamento demorasse muito mais tempo, provavelmente produziria "raças" humanas. Mas nossa espécie é muito recente, e sua divisão em subgrupos isolados não foi  suficientemente longa. A humanidade cresceu, se multiplicou, se deslocou e ocupou todo o planeta. A história produziu logo um grande reencontro. Com ele, o intercâmbio genético voltou a prevalecer amplamente, interrompendo a incipiente tendência anterior. Reiniciou-se um processo de homogeneização, antes que se formassem raças diferentes. Nossa são uma imposição 

A fusão de subgrupos humanos, acelerada na modernidade, foi mais radical no Brasil do que em qualquer outra parte do mundo. Sociedade recente, nascemos no exato momento em que o reencontro se acelerou. Dadas as características da colonização portuguesa e nosso papel na divisão mundial do trabalho, fomos levados a realizar um monumental processo de miscigenação, que predominou sobre outras tendências. Processo, é claro, assimétrico, como todos os demais, em uma sociedade de resto tão desigual.

Como resultado, não somos nem brancos, nem negros - somos mestiços. Biológica e culturalmente mestiços. Aqui, mais do que em qualquer outro lugar, a tentativa de constituir uma identidade baseada na "raça" é especialmente reacionária. A afirmação, que tantas vezes já ouvi, de que o Brasil é o país mais racista do mundo é uma patética manifestação de nosso esporte nacional favorito - falar mal de nós mesmos.

Os elementos culturais e ideológicos racistas, que subsistem entre nós, não interromperam nem conseguirão interromper o processo de construção de uma sociedade mestiça, cuja unidade tem sido dada pela bela capacidade de criar e recriar uma cultura de síntese. Mesmo assim, aqueles elementos precisam ser combatidos. Mas definir quotas será o melhor caminho? Devemos fixar o que não é fixo, separar o que não está separado? Quem é negro e quem é branco no Brasil? Onde está a fronteira entre ambos? E os brancos pobres, que são muitos, como ficam?

Melhor do que copiar também nisso os Estados Unidos - uma sociedade multiétnica, mas não essencialmente mestiça - seria, por exemplo, garantir uma escola pública universal, gratuita e de boa qualidade, onde todas as crianças convivessem juntas e recebessem a mesma educação fundamental. Crianças que brincam em playgrounds, viajam em automóveis vedados e estudam em escolas particulares, altamente seletivas, tendem a crescer com medo e raiva dos diferentes. Crianças que freqüentam espaços públicos e têm amigos de todas as cores dificilmente serão adultos racistas.

César Benjamin é autor de A Opção Brasileira (Editora Contraponto, 1998, nona edição) e integra a coordenação nacional do Movimento Consulta Popular.

César Benjamin é autor de A Opção Brasileira (Editora Contraponto, 1998, nona edição) e integra a coordenação nacional do Movimento Consulta Popular




TEXTO 4


Ideologia Tortuosa



O mito de a desigualdade racial ser produto das diferenças educacionais também está em xeque


No artigo “Tortuosos Caminhos” publicado na revista Caros Amigos de junho último, César Benjamin, a propósito de questionar a adoção de cotas para negros, reproduz a fórmula clássica do modus pensante e operandi nos marcos de nossa democracia racial: o Brasil é um país mestiço, portanto é impossível determinar quem é negro e quem é branco. E, ainda que isso fosse possível, raça é um conceito falacioso já desmascarado pela ciência contemporânea e, por fim, “constituir uma identidade baseada na raça é especialmente reacionário”, conclui Benjamin. Portanto, políticas afirmativas/cotas para negros seriam um anacronismo em nossa sociedade.
São argumentos de fácil aceitação pelo que reiteram das ideologias presentes no senso comum em que o elogio à mestiçagem e a crítica ao conceito de raça vem se prestando historicamente, não para fundamentar a construção de uma sociedade efetivamente igualitária do ponto de vista racial, e sim para nublar a percepção social sobre as práticas racialmente discriminatórias presentes em nossa sociedade.
A constatação da inexistência das raças e de que a diversidade intragrupos é maior do que entre os grupos diferentes, que a ciência vem nos revelando nos últimos tempos, não tem impacto sobre as diversas manifestações de racismo e discriminação em nossa sociedade e em ascensão no mundo, o que reafirma o caráter político do conceito de raça e a sua atualidade, a despeito de sua insustentabilidade do ponto de vista biológico.
Raça é hoje e sempre foi um conceito eminentemente político cujo sentido estratégico foi exemplarmente sintetizado pelo historiador Antony Mark em seu livro Making Race and Nation, onde ele afirma que: “Raça é uma questão central da política… porque o uso que as elites fizeram e fazem da diferença racial foi sempre com o objetivo de provar a superioridade branca e assim manter seus privilégios, à custa da escravidão e exploração. Essa atitude foi sempre compartilhada com os setores populares brancos interessados em se associar às elites. Historicamente, esse comportamento foi comum às elites do Brasil, da África do Sul e dos Estados Unidos”. A análise de César Benjamin deixa deliberadamente de fora os estudos atuais sobre as desigualdades raciais existentes no Brasil. Silencia também sobre as evidências empíricas da exclusão dos negros em todas as esferas privilegiadas da sociedade e sua concentração desproporcional nos bolsões de miséria e pobreza. Vivemos num país em que, segundo os estudos realizados pelo IPEA (Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas), há 53 milhões de pobres e, desses, 22 milhões são indigentes. 65 por cento e 70 por cento, respectivamente, desses pobres e indigentes são pessoas negras.
O DIEESE, em parceria com o Inspir (Instituto Sindical Interamericano pela Igualdade Racial), realizou outro estudo amplamente divulgado, o Mapa da População Negra no Mercado de Trabalho, que nos informa, por exemplo, que em São Paulo a taxa de desemprego da população economicamente ativa está assim distribuída: 25 por cento para as mulheres negras, 20,9 por cento para os homens negros, 19,2 por cento para as mulheres brancas e 13,8 por cento para os homens brancos.
Dados divulgados pelos ministérios do Trabalho e da Justiça na publicação Brasil, Gênero e Raça demonstram os diferenciais no rendimento médio nacional entre negros e brancos em salários mínimos: homem branco, 6,3 salários mínimos; mulher branca, 3,6; homem negro 2,9; mulher negra 1,7.
Porém, é a desagregação do IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) para negros e brancos que revela a magnitude da desigualdade racial no Brasil:
“O Brasil em 1999 foi classificado como um país de desenvolvimento humano mediano, ocupando a 79» posição, segundo o Índice de Desenvolvimento Humano, criado pelo PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), que é um instrumento de avaliação e mensuração das condições materiais e sociais de vida dos povos. Todavia, quando os indicadores de desenvolvimento humano são desagregados por sexo e raça da população negra no Brasil, conforme elaborado pela Federação de Associações de Órgãos de Assistência Social e Educação (FASE), evidenciam o impacto do racismo, fazendo com que o IDH relativo à população negra do Brasil ocupe a 108» posição, em contraponto ao da população branca, que ocupa a 49» posição.” *
Os negros apresentam, em todos os indicadores sociais constitutivos do IDH, brutais diferenças, das quais a mais dramática é uma esperança de vida, em média, seis anos inferior à dos brancos, variando até doze anos a menos quando desagregamos esse indicador por faixa etária ou região, como é o caso do Norte e Nordeste do país. O IDH da população negra brasileira ocupa cinco posições abaixo da África do Sul, país que até recentemente viveu sob o regime de apartheid.
Os diferentes IDHs encontrados para brancos e negros no Brasil refletem, por fim, a coexistência, num mesmo território, de dois países apartados.
Intencionalmente, César Benjamin passa também por cima do processo histórico que produziu essas desigualdades, ocultando os benefícios materiais e simbólicos auferidos pelos brancos:
  • da escravização dos negros, a principal fonte da acumulação primitiva de capital do país e da construção da riqueza das elites que se revezam no poder no Brasil;
  • da forma como se processou a “abolição” da escravidão, sem qualquer tipo de reparação aos negros pelos séculos de trabalho escravo e sem a implementação de qualquer política de integração social da massa escrava “liberta”;
  • da substituição da mão-de-obra negra pelo imigrante europeu no processo de industrialização pós-escravidão; uma perspectiva eugenista claramente assinalada na Constituição de 1934.
  • da restrição de sua participação política, visto que a Constituição de 1891 impedia o alistamento para as eleições aos mendigos e analfabetos (três anos após a abolição).
  • da absoluta impunidade de que gozam as atitudes racistas e discriminatórias em nossa sociedade, em especial no mercado de trabalho, o que assegura o acesso privilegiado dos brancos aos postos de maior prestígio e remuneração;
  • da desqualificação estética dos negros, em especial das mulheres negras;
  • da indiferença social em relação às ações dos órgãos de repressão e dos grupos de extermínio sobre as populações pobres, majoritariamente negras.
A despeito de todas essas evidências, César Benjamin afirma: “(…) não somos nem brancos nem negros – somos mestiços. Biológica e culturalmente mestiços. Aqui, mais do que em qualquer outro lugar, a tentativa de constituir uma identidade baseada na ‘raça’ é especialmente reacionária. A afirmação, que tantas vezes já ouvi, de que o Brasil é o país mais racista do mundo é uma patética manifestação de nosso esporte nacional favorito – falar mal de nós mesmos”.
Portanto, o negro é apenas uma realidade estatística para deleite acadêmico. Não tem concretude como credor social, demandador de políticas específicas em função das desigualdades de que padece, posto que essas são só reconhecíveis no plano virtual.
Pergunta-nos Benjamin: ”Devemos fixar o que não é fixo, separar o que não está separado? Quem é negro e quem é branco no Brasil? Onde está a fronteira entre ambos?”
A carnavalização das nossas relações raciais escamoteia a rigidez da segregação espacial e social que separa negros e brancos. Ignora solenemente a concentração dos negros nas favelas, palafitas, cortiços, nas periferias das grandes cidades. Ou seja, encontra-se naturalizado o paradigma casa-grande e senzala, por isso trata-se com quase absoluta indiferença essas desigualdades raciais. E, no entanto, as poucas, tímidas e insuficientes iniciativas voltadas para o enfrentamento dessas desigualdades, como é o caso das cotas, encontram rapidamente uma oposição aguerrida.
É nisto que reside a perversidade do racismo brasileiro:
  • Na negação patológica da dimensão racial das desigualdades sociais.
  • Nos eufemismos que são utilizados para mascará-las: se não há negros nem brancos, como poderá haver políticas específicas para negros? Ou, o problema no Brasil não é racial e sim social ou o que há é um apartheid social!
  • Na intransigente recusa de instituição de qualquer mecanismo redutor das desigualdades raciais.
  • Na defesa maníaca de propostas que postergam para as calendas o enfrentamento dessa realidade. A educação é sempre usada como panacéia nesses casos. Diz Benjamin que, em vez das cotas, “melhor… seria, por exemplo, garantir uma escola pública universal, gratuita e de boa qualidade, onde todas as crianças convivessem juntas e recebessem a mesma educação fundamental”. Enquanto a escola pública de qualidade não vem, os negros devem esperar, de preferência “bem quietinhos”, pois a reivindicação de política específica baseada na raça é, como diz o autor, “especialmente reacionária”.
Mas o mito de a desigualdade racial ser produto das diferenças educacionais também está em xeque.
Somos oficialmente 45 por cento da população do país e apenas 2 por cento de nós adentram o ensino universitário. Esse é o patamar de “eqüidade” alcançado, por exemplo, pelas políticas de universalistas no campo da educação. Pior, a avaliação dessas políticas empreendida pelo IPEA constatou que, apesar da democratização do acesso ao sistema educacional e da melhoria dos níveis educacionais de negros e brancos, desde a década de 20 do século anterior até o presente a diferença de escolarização de negros e brancos mantém-se inalterada. A conclusão desses estudos é que as políticas universalistas não têm sido capazes de alterar o padrão de desigualdade racial.
O conceito de raça se instituiu para justificar a dominação, a escravidão e a exploração de um grupo racial sobre outro. Hoje, a negação da realidade social da “raça” e da necessidade que dela decorre de focalizar as políticas públicas nos segmentos historicamente discriminados se presta à perpetuação da exclusão e dos privilégios que a ideologia que o sustenta produziu e reproduz cotidianamente.
Sueli Carneiro é diretora do Geledés Instituto da Mulher Negra. Pós-graduanda em filosofia da educação pela Universidade de São Paulo.

* Documento da Articulação de Mulheres Negras Brasileiras – Rumo à III Conferência Mundial contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e Formas Conexas de Intolerância, páginas 1 e 2.
http://www.geledes.org.br/em-debate/sueli-carneiro/463-ideologia-tortuosa

terça-feira, 28 de maio de 2013

FETICHE

O Fetichismo da mercadoria na obra de Karl Marx
Segundo o Minidicionário da Língua Portuguesa Aurélio, o termo fetiche significa “objeto animado ou inanimado, feito pelo homem ou produzido pela natureza, ao qual se atribui poder sobrenatural e se presta culto” (Holanda, 1993), foi este significado conferido ao fenômeno da atribuição de valor simbólico aos produtos (manufaturas) que o sociólogo porKarl Marx (1818 – 1883) observou em meio aos seus estudos sobre o mundo do trabalho na modernidade.
Marx em sua obra máxima intitulada “O Capital”, nota que a mercadoria (manufatura) quando finalizada, não mantinha o seu valor real de venda, que segundo ele era determinado pela quantidade de trabalho materializado no artigo, mas sim, que esta, por sua vez adquiria uma valoração de venda irreal e infundada, como se não fosse fruto do trabalho humano e nem pudesse ser mensurado, o que ele queria denunciar com isto é que a mercadoria parecia perder sua relação com o trabalho e ganhava vida própria.
Karl Marx denomina este fenômeno como sendo um “Fetiche da mercadoria”, para isto ele se baseia na história do personagem bíblico Moisés, que após vagar quarenta anos com o povo escolhido por Deus (Judeus) atrás da terra prometida se depara com a crescente descrença dos seus seguidores, que já estavam cansados de se deslocar errantemente por vários lugares, dado esta insatisfação Moisés, deixa o seu povo em uma terra fértil e se retira temporariamente para meditar e procurar algum sinal que indique a existência real deste Deus, a localização da terra prometida e que com isto possa recuperar a fé do seu povo que ia se perdendo rapidamente.
Moisés sobe ao monte Sinai e fica por muito tempo lá a meditar, o povo ao sentir o sumiço de seu “guia”, se reorganiza politicamente e espiritualmente naquele lugar onde fixaram sua vida material, elegendo a partir disto novas lideranças e novos deuses em que acreditar e orar. Muito tempo se passa em cima do monte Sinai, onde está Moises a meditar até que após vários dias e quem sabe meses os céus se abrem e deles surgem o sinal tão esperado pelo povo Judeu, as tabuas da salvação, onde estavam contidos os “Dez Mandamentos”. A partir deste sinal Moises, desce o monte Sinai e vai de encontro ao seu povo para lhes contar e mostrar a boa nova, ao chegar nota que estes haviam se reorganizado em sua ausência e que possuíam novas lideranças e principalmente que haviam juntado todo o ouro e jóias que carregavam consigo e fundiram estas para fazer uma imagem, um novo Deus, que segundo a bíblia seria a imagem de um animal (possivelmente um bezerro) que havia se tornado objeto de adoração e glorificação pelo povo, o nome atribuído a esta imagem era “Fetiche”.
Marx se utilizou desta parábola bíblica e principalmente do nome atribuído à imagem citada para exemplificar na modernidade como o homem estava tratando as mercadorias (sapatos, bolsas, etc.), estas, que com o tempo deixaram de ser um produto estritamente humano para tornarem-se objeto de adoração, a mercadoria deixa de ter a sua utilidade atual e passa a atribuir um valor simbólico, quase que divino, o ser humano não compra o real, mas sim a transcendência que determinado artefato representa.
Este tema infelizmente não foi suficientemente esgotado por Marx que faleceu prematuramente em 1883, porém outros filósofos e sociólogos Neo-Marxistas da pós-modernidade como Max Horkheimer, Theodor Adorno, Walter Benjamin, Bernard Stiegler, Gilles Lipovetsky, Antonio Negri, Alain Badiou, se ocuparam deste assunto, assim criando uma tradição rica de analise deste fenômeno da fetichisação da mercadoria, como esta se dá objetivamente e subjetivamente no ser humano e principalmente propondo encaminhamentos para a resolução deste problema.
Autor: Leonardo Dlugokenski
Fontes
SELL, C.E. Sociologia clássica: Durkheim, Weber e Marx. Itajaí: Editora Univali, 2006.
MARX, Karl. O Capital. São Paulo: Centauro Editora, 2005.
MANNION, James. O livro completo da filosofia. São Paulo; Madras, 2006
OLIVEIRA, Pérsio Santos de. Introdução à Sociologia: Série Brasil. São Paulo; Ática, 2006.

segunda-feira, 27 de maio de 2013

Opinião - "Meu filho, você não merece nada" por Eliane Brum

A crença de que a felicidade é um direito tem tornado despreparada a geração mais preparada

Ao conviver com os bem mais jovens, com aqueles que se tornaram adultos há pouco e com aqueles que estão tateando para virar gente grande, percebo que estamos diante da geração mais preparada – e, ao mesmo tempo, da mais despreparada. Preparada do ponto de vista das habilidades, despreparada porque não sabe lidar com frustrações. Preparada porque é capaz de usar as ferramentas da tecnologia, despreparada porque despreza o esforço. Preparada porque conhece o mundo em viagens protegidas, despreparada porque desconhece a fragilidade da matéria da vida. E por tudo isso sofre, sofre muito, porque foi ensinada a acreditar que nasceu com o patrimônio da felicidade. E não foi ensinada a criar a partir da dor.

Há uma geração de classe média que estudou em bons colégios, é fluente em outras línguas, viajou para o exterior e teve acesso à cultura e à tecnologia. Uma geração que teve muito mais do que seus pais. Ao mesmo tempo, cresceu com a ilusão de que a vida é fácil. Ou que já nascem prontos – bastaria apenas que o mundo reconhecesse a sua genialidade.

Tenho me deparado com jovens que esperam ter no mercado de trabalho uma continuação de suas casas – onde o chefe seria um pai ou uma mãe complacente, que tudo concede. Foram ensinados a pensar que merecem, seja lá o que for que queiram. E quando isso não acontece – porque obviamente não acontece – sentem-se traídos, revoltam-se com a “injustiça” e boa parte se emburra e desiste.


Como esses estreantes na vida adulta foram crianças e adolescentes que ganharam tudo, sem ter de lutar por quase nada de relevante, desconhecem que a vida é construção – e para conquistar um espaço no mundo é preciso ralar muito. Com ética e honestidade – e não a cotoveladas ou aos gritos. Como seus pais não conseguiram dizer, é o mundo que anuncia a eles uma nova não lá muito animadora: viver é para os insistentes.


Por que boa parte dessa nova geração é assim? Penso que este é um questionamento importante para quem está educando uma criança ou um adolescente hoje. Nossa época tem sido marcada pela ilusão de que a felicidade é uma espécie de direito. E tenho testemunhado a angústia de muitos pais para garantir que os filhos sejam “felizes”. Pais que fazem malabarismos para dar tudo aos filhos e protegê-los de todos os perrengues – sem esperar nenhuma responsabilização nem reciprocidade.


É como se os filhos nascessem e imediatamente os pais já se tornassem devedores. Para estes, frustrar os filhos é sinônimo de fracasso pessoal. Mas é possível uma vida sem frustrações? Não é importante que os filhos compreendam como parte do processo educativo duas premissas básicas do viver, a frustração e o esforço? Ou a falta e a busca, duas faces de um mesmo movimento? Existe alguém que viva sem se confrontar dia após dia com os limites tanto de sua condição humana como de suas capacidades individuais?

Nossa classe média parece desprezar o esforço. Prefere a genialidade. O valor está no dom, naquilo que já nasce pronto. Dizer que “fulano é esforçado” é quase uma ofensa. Ter de dar duro para conquistar algo parece já vir assinalado com o carimbo de perdedor. Bacana é o cara que não estudou, passou a noite na balada e foi aprovado no vestibular de Medicina. Este atesta a excelência dos genes de seus pais. Esforçar-se é, no máximo, coisa para os filhos da classe C, que ainda precisam assegurar seu lugar no país.


Da mesma forma que supostamente seria possível construir um lugar sem esforço, existe a crença não menos fantasiosa de que é possível viver sem sofrer. De que as dores inerentes a toda vida são uma anomalia e, como percebo em muitos jovens, uma espécie de traição ao futuro que deveria estar garantido. Pais e filhos têm pagado caro pela crença de que a felicidade é um direito. E a frustração um fracasso. Talvez aí esteja uma pista para compreender a geração do “eu mereço”.


Basta andar por esse mundo para testemunhar o rosto de espanto e de mágoa de jovens ao descobrir que a vida não é como os pais tinham lhes prometido. Expressão que logo muda para o emburramento. E o pior é que sofrem terrivelmente. Porque possuem muitas habilidades e ferramentas, mas não têm o menor preparo para lidar com a dor e as decepções. Nem imaginam que viver é também ter de aceitar limitações – e que ninguém, por mais brilhante que seja, consegue tudo o que quer.


A questão, como poderia formular o filósofo Garrincha, é: “Estes pais e estes filhos combinaram com a vida que seria fácil”? É no passar dos dias que a conta não fecha e o projeto construído sobre fumaça desaparece deixando nenhum chão. Ninguém descobre que viver é complicado quando cresce ou deveria crescer – este momento é apenas quando a condição humana, frágil e falha, começa a se explicitar no confronto com os muros da realidade. Desde sempre sofremos. E mais vamos sofrer se não temos espaço nem mesmo para falar da tristeza e da confusão.


Me parece que é isso que tem acontecido em muitas famílias por aí: se a felicidade é um imperativo, o item principal do pacote completo que os pais supostamente teriam de garantir aos filhos para serem considerados bem sucedidos, como falar de dor, de medo e da sensação de se sentir desencaixado? Não há espaço para nada que seja da vida, que pertença aos espasmos de crescer duvidando de seu lugar no mundo, porque isso seria um reconhecimento da falência do projeto familiar construído sobre a ilusão da felicidade e da completude.


Quando o que não pode ser dito vira sintoma – já que ninguém está disposto a escutar, porque escutar significaria rever escolhas e reconhecer equívocos – o mais fácil é calar. E não por acaso se cala com medicamentos e cada vez mais cedo o desconforto de crianças que não se comportam segundo o manual. Assim, a família pode tocar o cotidiano sem que ninguém precise olhar de verdade para ninguém dentro de casa.


Se os filhos têm o direito de ser felizes simplesmente porque existem – e aos pais caberia garantir esse direito – que tipo de relação pais e filhos podem ter? Como seria possível estabelecer um vínculo genuíno se o sofrimento, o medo e as dúvidas estão previamente fora dele? Se a relação está construída sobre uma ilusão, só é possível fingir.


Aos filhos cabe fingir felicidade – e, como não conseguem, passam a exigir cada vez mais de tudo, especialmente coisas materiais, já que estas são as mais fáceis de alcançar – e aos pais cabe fingir ter a possibilidade de garantir a felicidade, o que sabem intimamente que é uma mentira porque a sentem na própria pele dia após dia. É pelos objetos de consumo que a novela familiar tem se desenrolado, onde os pais fazem de conta que dão o que ninguém pode dar, e os filhos simulam receber o que só eles podem buscar. E por isso logo é preciso criar uma nova demanda para manter o jogo funcionando.


O resultado disso é pais e filhos angustiados, que vão conviver uma vida inteira, mas se desconhecem. E, portanto, estão perdendo uma grande chance. Todos sofrem muito nesse teatro de desencontros anunciados. E mais sofrem porque precisam fingir que existe uma vida em que se pode tudo. E acreditar que se pode tudo é o atalho mais rápido para alcançar não a frustração que move, mas aquela que paralisa.


Quando converso com esses jovens no parapeito da vida adulta, com suas imensas possibilidades e riscos tão grandiosos quanto, percebo que precisam muito de realidade. Com tudo o que a realidade é. Sim, assumir a narrativa da própria vida é para quem tem coragem. Não é complicado porque você vai ter competidores com habilidades iguais ou superiores a sua, mas porque se tornar aquilo que se é, buscar a própria voz, é escolher um percurso pontilhado de desvios e sem nenhuma certeza de chegada. É viver com dúvidas e ter de responder pelas próprias escolhas. Mas é nesse movimento que a gente vira gente grande.

 
Seria muito bacana que os pais de hoje entendessem que tão importante quanto uma boa escola ou um curso de línguas ou um Ipad é dizer de vez em quando: “Te vira, meu filho. Você sempre poderá contar comigo, mas essa briga é tua”. Assim como sentar para jantar e falar da vida como ela é: “Olha, meu dia foi difícil” ou “Estou com dúvidas, estou com medo, estou confuso” ou “Não sei o que fazer, mas estou tentando descobrir”. Porque fingir que está tudo bem e que tudo pode significa dizer ao seu filho que você não confia nele nem o respeita, já que o trata como um imbecil, incapaz de compreender a matéria da existência. É tão ruim quanto ligar a TV em volume alto o suficiente para que nada que ameace o frágil equilíbrio doméstico possa ser dito.


Agora, se os pais mentiram que a felicidade é um direito e seu filho merece tudo simplesmente por existir, paciência. De nada vai adiantar choramingar ou emburrar ao descobrir que vai ter de conquistar seu espaço no mundo sem nenhuma garantia. O melhor a fazer é ter a coragem de escolher. Seja a escolha de lutar pelo seu desejo – ou para descobri-lo –, seja a de abrir mão dele. E não culpar ninguém porque eventualmente não deu certo, porque com certeza vai dar errado muitas vezes. Ou transferir para o outro a responsabilidade pela sua desistência.


Crescer é compreender que o fato de a vida ser falta não a torna menor. Sim, a vida é insuficiente. Mas é o que temos. E é melhor não perder tempo se sentindo injustiçado porque um dia ela acaba.


(Eliane Brum escreve às segundas-feiras.

terça-feira, 21 de maio de 2013

COLETÂNEA - Embargos a Cuba e Yoani Sánchez


Cuba: o embargo injustificado (texto adaptado de: “Cuba, o embargo injustificado, o papel do brasil e dos eua” )
por DAVIS SENA FILHO - 19 DE FEVEREIRO DE 2013 ÀS 09:47
O bloqueio econômico, financeiro e comercial a Cuba, imposto pelos Estados Unidos em 1962, no governo do democrata John F. Kennedy, é um dos bloqueios mais longos que se tem notícia no mundo contemporâneo, além de ser considerado cruel pelos organismos internacionais, a exemplo da Assembleia Geral da ONU, que aprovou, em 13 de novembro de 2012, a 21ª resolução de condenação ao embargo econômico a Cuba. Apenas os Estados Unidos, Israel e Palau ficaram a favor do embargo. No dia 7 de fevereiro deste ano, o bloqueio completou 51 anos, ou seja, mais de meio século, e foi transformado em lei em 1992 e 1995. O ex-presidente dos EUA, Bill Clinton, também democrata, ampliou o embargo comercial ao pequeno país caribenho em 1999, o que acarretou a proibição de filiais estrangeiras de empresas do país yankee de comercializar com Cuba valores que ultrapassem a US$ 700 milhões, o que é um absurdo e uma gota no oceano em termos de comércio exterior.
A Assembleia das Nações Unidas rejeita, reiteradamente, a política isolacionista promovida pelo governo estadunidense e o seu Departamento de Estado contra Cuba. Tal Departamento, cuja doutrina de política externa é o porrete, transformou-se em alvo de críticas internas contundentes por parte de entidades estadunidenses, contrárias ao bloqueio, ao argumentarem que não existem normas no direito internacional que justifiquem um embargo tão radical em tempo de paz, de globalização, além do fim da Guerra Fria, que ocorreu, simbolicamente, com a queda do Muro de Berlim, em 1989.
Cuba enfrenta mais de cinco décadas de guerra econômica. Para se ter uma ideia do que é isto, ao longo de 51 anos a ilha cubana teve prejuízos que chegam a mais de US$ 1 trilhão, valor este elevado para um país tão pequeno. É algo incompreensível, com o fim da Guerra Fria, os Estados Unidos ainda não mudarem sua política externa para com cubanos. E sabem por que essa realidade acontece? Respondo: Cuba atual não é importante economicamente, mas o é politicamente e ideologicamente, com forte conotação simbólica, que remonta a guerrilha de Fidel Castro e Che Guevara, ícones internacionais e que até hoje povoam o imaginário de diversas gerações — as mais jovens e as mais antigas. Combater e sufocar Cuba é essencial para os grandes capitalistas e seus governos, porque acreditam que dessa forma "matam" o sonho do socialismo (…).

(Fonte: http://www.brasil247.com/pt/247/poder/93967/)


Cuba denuncia bloqueio e terrorismo estadunidenses

24 DE ABRIL DE 2013 - 5H57

 

A embaixadora de Cuba em Genebra, Anayansi Rodríguez, denunciou nesta terça-feira (23) o bloqueio imposto pelos Estados Unidos faz mais de 50 anos contra seu país e as ações terroristas promovidas e financiadas por Washington ou organizadas desde seu território.


O bloqueio é um ato de genocídio, de acordo com a Convenção de Genebra de 1948, assinalou Rodríguez em um encontro com a imprensa, acadêmicos, pessoal diplomático e amigos da Revolução, por ocasião da próxima participação de Cuba no Exame Periódico Universal (EPU).
O EPU é um mecanismo de revisão periódica das obrigações e compromissos em matéria de direitos humanos.
Esse cerco econômico, comercial e financeiro causa consequências concretas em todos os âmbitos, por isso dizemos que constitui a principal violação de todos os direitos humanos do povo cubano, expressou a embaixadora em resposta a uma pergunta da Prensa Latina.
De acordo com o informe que Cuba a apresentará diante do EPU, até dezembro de 2011 esta guerra econômica ocasionou danos econômicos de mais de um bilhão de dólares, considerando a depreciação dessa moeda frente ao valor do ouro no mercado internacional.
A embaixadora cubana em Genebra denunciou também as ações terroristas promovidas pelos Estados Unidos ou que são organizadas a partir de seu território. Esses atos causaram milhares de vítimas, ocasionaram dor nas famílias cubanas e enormes danos também no âmbito econômico, expressou.
Um dos casos que a embaixadora recordou foi o da bomba detonada em pleno voo de um avião da companhia aérea Cubana de Aviação em 1976 onde perderam a vida 73 passageiros, entre eles a equipe de esgrima de seu país.
Como resultado de 681 ações terroristas e uma invasão mercenária, todas provadas e documentadas, ocorreu a perda irreparável das vidas de 3.478 mulheres, homens e crianças, enquanto outros 2.099 ficaram fisicamente incapacitados.
No encontro, efetuado na sede diplomática cubana depois de uma videoconferência realizada de maneira conjunta com Havana, Umberto Mazzei, que dirige em Genebra o Instituto de Relações Econômicas, condenou a política seguida pelos Estados Unidos contra Cuba.
O bloqueio busca impedir que o país caribenho se desenvolva e possa ter êxito, disse Mazzei, e recordou que esse cerco foi condenado em reiteradas ocasiões pela quase totalidade dos países da ONU.
Prensa Latina     
                            (Fonte: http://www.vermelho.org.br/noticia.php?id_secao=7&id_noticia=211832)



EUA criticam agressão à Yoani Sanchez

• terça, 10 de novembro de 2009

HAVANA - O Departamento de Estado dos EUA divulgou ontem um comunicado censurando ataques a três blogueiros cubanos, incluindo Yoani Sanchez, que ganhou notoriedade internacional por suas críticas à vida na ilha.
"O governo americano deplora a agressão aos blogueiros Yoani Sanchez, Orlando Luis Pardo e Claudia Cadelo", afirma o documento.
Sanchez disse na semana passada que dois agentes federais de Cuba vestidos à paisana abordaram a ela e a Pardo no bairro de Vedado, em Havana, enquanto eles participavam de uma marcha contra a violência.
Ela também afirmou que foi obrigada a entrar em um carro, assim como ocorreu com Pardo, onde os agentes lhe agrediram. Logo depois ambos foram libertados perto de suas respectivas casas.
O governo cubano não comentou os fatos. Não há como provar que autoridades de segurança do Estado estavam envolvidas, mas é comum a perseguição à opositores do governo.
No começo do ano, a revista Time nomeou Sanchez uma das 100 pessoas mais influentes do mundo. Em outubro, o governo de Cuba negou permissão para que ela viajasse a Nova York para receber um prêmio de jornalismo.



A tecnologia pode mudar Cuba, diz Yoani

Washington - A blogueira cubana Yoani Sánchez disse nesta terça-feira que a tecnologia não é o bastante para mudar Cuba, mas ajudará no processo até que se tenha uma "sociedade livre".

"A tecnologia, as redes sociais, desgastam o controle que o Estado tem sobre a informação em Cuba", afirmou Yoani, de 37 anos, que se reuniu com legisladores dos Estados Unidos e depois falou no Instituto Cato, em Washington.
Dez anos depois da detenção de 75 jornalistas independentes, o governo de Raúl Castro usa "métodos repressivos diferentes, desde as detenções arbitrárias e não documentadas à paramilitarização da repressão".
Yoani, que realiza uma viagem por países da Europa e da América após ter conseguido seu primeiro passaporte em cinco anos, se reuniu com a democrata Debie Wasserman Schultz, o senador republicano Gill Nelson e os representantes republicanos Joe García, Ileana Ros-Lehtinen e Mario Díaz Balart, da Flórida.
A cubana explicou que se opõe à continuação do embargo que os EUA mantêm contra Cuba desde 1960, "porque não impediu a repressão e, por outro lado, serviu para o regime como desculpa para tudo, desde a falta de comida na mesa cubana à falta de liberdade nos espaços públicos".
A suspensão do embargo, ao qual se opõem outros dissidentes cubanos, poderia fortalecer o governo de Cuba ao trazer prosperidade econômica, reconheceu Yoani.
"Mas o que eu conheço e é real para mim é que o embargo não impediu a repressão", acrescentou. O dissidente cubano Orlando Luis Pardo, que acompanhou Yoani no Instituto Cato, se referiu ao perigo de "uma falsa mudança" que ocorreria se a abertura ao capital estrangeiro em Cuba controlar "as hierarquias do regime, eclesiásticas, empresariais e do exílio cubano".
"Ao contrário do regime, que é monolítico e apresenta um só ponto de vista, a oposição é democrática, inclui diferentes opiniões sobre como avançaremos rumo à democracia e sobre o que fazer com o embargo", apontou Yoani.
"Não estou aqui como política ou como jornalista, mas como cidadã de um país onde sê-lo é uma ideia, não uma realidade ainda", continuou.
Yoani lembrou que há justamente uma década o governo de Cuba deteve, acusou e processou 75 dissidentes e jornalistas independentes, e afirmou que aquela ação "começou a ter um custo político internacional para o governo".
"Se agora o governo voltasse a capturar a um grupo de dissidentes, a resposta da comunidade internacional seria imediata", acrescentou a blogueira, que opinou que esta sua primeira viagem aos Estados Unidos lhe deu uma exposição internacional "que talvez funcione como proteção por algumas semanas, meses ou anos".
"Enquanto durar, minha intenção é tirar todo o proveito possível", assinalou.
Yoani pediu a intensificação dos vínculos pessoais com cubanos na ilha e assinalou que quem viajar ao país "deve afastar-se dos hotéis, das excursões bem organizadas pelo governo, para falar com as pessoas comuns, para levar um jornal, uma revista, informação".
"É muito importante a contribuição da capacitação tecnológica, dispor de um ´hard drive´, um computador que esteja fora do controle monopólico do governo. Se circulasse mais informação, o tempo do modelo cubano atual estaria contado", concluiu.

 

Em Cuba, internet segue lenta, apesar de cabo venezuelano

Sarah Rainsford

Da BBC em Havana
Atualizado em 26 de maio, 2012 - 19:21 (Brasília) 22:21 GMT
                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                           
Apenas uma pequena parte da população tem permissão para acessar a rede em casa, como cientistas ou trabalhadores de empresas estrangeiras.
Mesmo para eles, a conexão é insuportavelmente lenta, através de telefone, e cara. Há hotéis com acesso à internet via WiFi, mas seu custo é de US$ 8 por hora, equivalente à metade do que ganha por mês um trabalhador estatal.
Mas nesta semana o ministro venezuelano de Ciência, Jorge Arreaza, disse a jornalistas estrangeiros que o esperado cabo submarino de fibra ótica que levará internet de alta velocidade a Cuba já está em operação.
"Dependerá do governo de Cuba para que o utiliza, não? Obviamente este é um assunto soberano deles, mas sabemos que o cabo submarino está em plena operação", disse Arreaza em entrevista coletiva.
As autoridades cubanas ainda não comentaram o assunto. Esta é a primeira informação oficial que se tem sobre o cabo em mais de um ano.

Expectativa

Em uma cerimônia no ano passado, foi anunciada a chegada da alta velocidade graças ao cabo de fibra ótica venezuelano, o que gerou grande expectativa.
O governo sempre culpou o embargo dos Estados Unidos pela má qualidade da internet cubana: sem um cabo que uma a ilha ao continente, o país precisa se conectar através de satélite, a um custo considerável.
As autoridades consideraram o cabo uma vitória contra o embargo americano. Enquanto isso, para os cubanos, o fim da falta de conexão à internet parecia iminente.
Mas o que se seguiu à cerimônia foi o silêncio. Surgiram rumores sobre complicações técnicas, e outros sobre o medo do governo de perder o controle da informação.
Logo se falou que os encarregados do projeto haviam sido presos por malversação de fundos.
Mas nesta semana, em Havana, o presidente do Supremo Tribunal cubano, Rubén Remigio, negou que alguém estivesse sendo julgado por essas acusações em qualquer corte cubana, apesar de ter agregado que isso não significava que não houvesse alguma investigação em curso.
Também disse, em entrevista à BBC, que não havia notado nenhuma melhora na conexão à internet que tem em seu gabinete.
"Creio que estão fazendo ajustes técnicos", disse Remigio. "Não sei. Mas estamos ainda esperando."
Enquanto isso, ao escrever esta reportagem para a BBC, a minha lenta conexão à internet caiu. Lá fora está chovendo, a interferência dos elementos é um sinal claro de que eu, ao menos, sigo conectada à internet através de satélite.





Cuba desbloqueia acesso a blogs dissidentes

SÃO PAULO - O Governo de Cuba decidiu desbloquear o acesso a alguns blogs considerados dissidentes pelo regime.
Entre eles está o da filósofa Yoani Sánchez, que pela primeira vez em quase três anos, poderá novamente publicar seus textos na web. De acordo com o jornal El País, Yoani comemorou a decisão, apesar de lamentar todo o período de censura. Ela foi informada do desbloqueio por um amigo, que tentou e conseguiu acessar a URL de seu site.
O primeiro portal de jornalismo cidadão cubano, o Desde Cuba, foi criado em fevereiro de 2006, e contava com a participação de diversos pensadores, escritores e jornalistas locais. Porém, após ganhar relevância internacional, o site foi censurado pelo governo cubano. Para substituí-lo, os oposicionistas criaram o Vozes Cubanas, em janeiro de 2009, que foi censurado em agosto do mesmo ano.
Em Cuba, a internet está disponível quase que apenas para funcionários do Governo, em universidades e empresários estrangeiros. Turistas podem acessar a rede em hotéis, mesmo lugar usado pelos oposicionistas para se conectarem.
Na terça-feira, o vice-ministro de Comunicações do país, Jorge Luis Perdomo, declarou que não vê "nenhum obstáculo político" para abrir o acesso da população à internet.
Também nesta semana, um cabo venezuelano de fibra óptica chegou ao país, acelerando em 3 000 vezes a baixa velocidade de conexão da ilha e burlando as restrições de conectividade impostas pelos Estados Unidos. O cabo foi estendido a partir da costa sul-americana, passando sob o mar do Caribe.



Cuba cria regulamento para organizar uso da rede

Por Agência EFE

• Quinta-feira, 11 de abril de 2013 - 17h00


Havana - O Ministério de Comunicações de Cuba aprovou um regulamento para os nomes de domínio usados na internet, com o objetivo de "organizar" a gestão do país na rede.
O regulamento, publicado nesta quinta-feira no site da "Gazeta Oficial", estabelece um sistema de "ordenamento" e planos para a "atribuição e registro dos nomes de domínio" de todos os órgãos estatais e da Administração Central do Estado.
O processo será supervisionado pela Agência de Controle e Supervisão do Ministério e seu objetivo é que o sistema de nomes de domínio de Cuba constitua um serviço "distribuído, hierárquico e escalável com controle descentralizado".
O documento explica que Cuba "foi criando condições necessárias para adequar, coordenar e regular as políticas que regem a internet" e o correto funcionamento das redes "é importante para o desenvolvimento econômico e social do país".
Em janeiro, o Governo cubano anunciou que o cabo submarino de fibra óptica que chegou à ilha em 2011 para melhorar sua conexão à internet está em operação desde 2012 e eram realizadas "prova de tráficos" na rede
Nessa mesma informação, o Governo disse que a operabilidade do cabo não representaria um crescimento automático de "possibilidades de acesso" à internet no país.
Cuba culpa o bloqueio dos Estados Unidos à ilha desde 1962 pelos problemas de sua conexão à internet, porque essa política obriga o país a entrar na rede mediante a um link por satélite que faz a conexão ficar lenta e cara.
O projeto do cabo submarino, em conjunto com a Venezuela, foi desenvolvido como uma alternativa para essa situação e prevê que possa multiplicar por 3 mil a capacidade de conexão à internet de Cuba.
O Governo cubano insistiu em sua "vontade política" de estender o acesso "social" à internet, principalmente em escolas e instituições estatais.



Sugestõe:
- Entrevista da Yoni Sanches ao programa “Roda Viva” da TV Cultura:
Bloco 1: 
Bloco 2: 

Bloco 3:   
Bloco 4: 


- Entrevista de Fidel Castro ao programa “Roda Viva” da TV Cultura:


- Livro: “Ao sul do rio Grande: imaginando a América Latina em seleções: oeste, wilderness e fronteira (1942-1970). Autora: Mary Anne Junqueira.

- Livro: “ Nossos agentes em Havana: como os cubanos ridicularizaram a CIA”. Autor: Jean-Marc Pillas.

- Filme: “Buena Vista Social Club”.