quinta-feira, 25 de abril de 2013

"DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL"

Texto 1: “Sustentar” - O verbo sugere: fundamento, ponto de apoio. Alguns de seus sinônimos podem se apresentar correlacionados a: 1 alimentar: nutrir < s. um filho > 2 apoiar: equilibrar, firmar, suster < o muro sustenta as paredes da velha casa > 3 auxiliar: defender, escudar, proteger, resguardar, salvaguardar, socorrer < um crédito amplo sustentou a instituição financeira > Antônimos: abandonar, atacar, expor, desamparar. (fonte: Dicionário Houaiss – Sinônimos e antônimos; Ed. Objetiva, 2003).

Texto 2: No prefácio do livro do economista José Eli da Veiga - Desenvolvimento sustentável: o desafio do século XXI. Ed. Garamond, Rio de Janeiro, 2008; Ignacy Sachs, economista de origem polonesa, naturalizado francês e tido como criador do termo “Desenvolvimento Sustentável”, aperesenta a seguintes considerações:
Na segunda metade do século passado, impulsionado pelos processos de descolonização e de emancipação do Terceiro Mundo e pela emergência do sistema das Nações Unidas, o desenvolvimento, um avatar do progresso iluminista, firmou-se como uma das idées-force das ciências sociais, configurando uma problemática ampla de caráter pluri e transdisciplinar, atravessada por polêmicas vivas de caráter ideológico e teórico.
Idéia, visão, conceito, utopia? Não creio que devamos nos envolver neste debate semântico. O que importa é deixar bem claro que o desenvolvimento não se confunde com crescimento econômico, que constitui apenas a sua condição necessária, porém não suficiente. Como bem disse Celso Furtado num dos seus derradeiros pronunciamentos, “só haverá verdadeiro desenvolvimento – que não se deve confundir com crescimento econômico, no mais das vezes resultado de mera modernização das elites – ali onde existir um projeto social subjacente”.
Por isso, em última instância, o desenvolvimento depende da cultura, na medida em que ele implica a invenção de um projeto. Este não pode se limitar unicamente aos aspectos sociais e sua base econômica, ignorando as relações complexas entre o porvir das sociedades humanas e a evolução da biosfera; na realidade, estamos na presença de uma co-evolução entre dois sistemas que se regem por escalas de tempo e escalas espaciais distintas. A sustentabilidade no tempo das civilizações humanas vai depender da sua capacidade de se submeter aos preceitos de prudência ecológica e de fazer um bom uso da natureza. É por isso que falamos em desenvolvimento sustentável. A rigor, a adjetivação deveria ser desdobrada em socialmente includente, ambientalmente sustentável e economicamente sustentado no tempo.
Tudo indica que a idéia do desenvolvimento não perderá a sua centralidade nas ciências sociais do século que se inicia. Mais do que nunca precisamos enfrentar as abismais desigualdades sociais entre nações e dentro das nações e fazê-lo de maneira a não comprometer o futuro da humanidade por mudanças climáticas irreversíveis e deletérias.
No entanto, a problemática do desenvolvimento passou de moda e o seu status acadêmico é cada vez mais marginal. As razões são múltiplas.
A teologia do mercado, que faz hoje a cabeça de muitos economistas, torna redundante o conceito de desenvolvimento.
Por sua vez, os adeptos da ecologia profunda teimam em considerar o crescimento econômico como um mal absoluto, quaisquer que sejam as suas modalidades e os usos sociais do seu produto.
Por fim existem os desencantados do desenvolvimento, que apontam o fracasso bastante geral das políticas que se reclamavam do desenvolvimentismo para justificar o abandono puro e simples do conceito do desenvolvimento, visto por alguns como uma mera armadilha ideológica inventada por políticos do primeiro mundo para perpetuar seu domínio sobre os países periféricos.
Este fracasso é indiscutível, porém como avaliá-lo sem lançar mão do conceito normativo de desenvolvimento ou, ainda melhor, sem recorrer ao par desenvolvimento/mau-desenvolvimento que configura um contínuo de situações possíveis? Sobretudo, como definir políticas de saída do mau-desenvolvimento reinante na ausência de um projeto de desenvolvimento visionário e exequível?

Texto 3: Atual modelo econômico representa entrave para desenvolvimento sustentável, criticam ambientalistas – (15/06/2012 - Wellton Máximo - Repórter da Agência Brasil) - Brasília – A receita para garantir o crescimento do país tem sido a mesma nos últimos anos: estimular o mercado interno, principalmente em momentos de dificuldade da economia. No entanto, as exonerações e o crédito fácil que aquecem o consumo trazem impactos ao meio ambiente. Da poluição dos carros novos com impostos reduzidos ao lixo despejado pelos compradores que trocam de eletrodomésticos e celulares, as medidas de estímulo deixam um passivo ambiental.
Segundo ambientalistas ouvidos pela Agência Brasil, o modelo econômico em vigor representa um entrave para o desenvolvimento sustentável do país. E é justamente o modelo econômico baseado no consumo um dos pontos em maior evidência nas discussões da Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), que prossegue até o dia 22 no capital fluminense.
O principal problema, dizem os ambientalistas, consiste na falta de visão de longo prazo, que leve em conta a disponibilidade dos recursos naturais no futuro e assegure a diminuição das emissões de gás carbônico nos próximos anos.
“É fundamental para o Brasil agregar renda e superar a pobreza, mas tudo isso deve ser feito sem consumir possibilidades futuras”, avalia o diretor sênior de Políticas da organização não governamental Conservação Internacional, Valmir Ortega. “No modelo atual, estamos gastando o dinheiro do jantar no almoço e corremos o risco de sofrer sérios problemas no futuro.”
Para o professor Gustavo Souto Maior, do Núcleo de Estudos Ambientais da Universidade de Brasília (UnB), as políticas adotadas no Brasil vão na contramão de medidas adotadas por outros países, que têm criado restrições ao transporte individual e estimulado o transporte coletivo. “Na Dinamarca, o governo desestimula a compra de carros por meio de um imposto altíssimo, mas o Brasil continua apostando no transporte individual falido, que compromete a mobilidade urbana e aumenta o consumo de combustível”, ressalta.
Secretária executiva do Instituto Socioambiental (ISA), Adriana Ramos considera importantes as reduções de impostos, mas diz que as desonerações devem contemplar setores que investem em inovações tecnológicas e no respeito ao meio ambiente. “Se é para reduzir impostos, que o governo olhe a economia de forma mais ampla e estimule novas cadeias produtivas que promovam o desenvolvimento sustentável”, declara.
Ortega, da Conservação Internacional, diz que os incentivos à economia verde até existem, mas em volume insuficiente. “O governo criou uma linha de crédito para plantios de baixo carbono, mas o orçamento não chega a ser um décimo do Plano Safra, que financia toda a agricultura. O que hoje é nicho deveria ser o foco principal das políticas públicas”, diz.
Os especialistas destacam que a mudança de prioridades poderia ser feita sem aumento dos gastos públicos. “Basta reorientar os incentivos fiscais e monetários existentes”, opina Souto Maior. Para ele, os próprios conceitos econômicos contribuem para a falta de prioridade do meio ambiente na formulação de políticas. “Pelos critérios tradicionais, quanto mais árvores se cortam, mais o PIB [Produto Interno Bruto, a soma da produção de um país] aumenta”, critica.
Entre os novos setores que podem ser beneficiados com incentivos fiscais, os especialistas citam o turismo nos parques nacionais, o transporte público, o saneamento básico e as compensações ambientais para obras de infraestrutura. “Não queremos abrir mão do crescimento, só fazer o país pensar no longo prazo. O pré-sal pode ser explorado, desde que as receitas do petróleo financiem o desenvolvimento de novas tecnologias”, acrescenta Ortega.

Tema: Levando em conta os textos relacionados e a problemática que trazem, é possível, considerando o modelo social-econômico em que a sociedade contemporânea se estrutura, crer na sustentabilidade do “Desenvolvimento Sustentável”?

sábado, 20 de abril de 2013

TEXTOS COMPLEMENTARES SOBRE A "PEC DOS EMPREGADOS DOMÉSTICOS"

As empregadas e a escravidão

Publicado em 16/04/2013 | Deixe um comentário
Por Urariano Mota.*

Por caminhos tortos, Joaquim Nabuco teve uma das suas iluminações quando escreveu: “A escravidão permanecerá por muito tempo como a característica nacional do Brasil”. Sim, por caminhos tortos, porque depois de uma frase tão magnífica – de gênio do futuro –, Joaquim Nabuco, sem pausa, continuou num encanto que esconde a crueldade:

“Ela [a escravidão] espalhou por nossas vastas solidões uma grande suavidade; seu contato foi a primeira forma que recebeu a natureza virgem do país, e foi a que ele guardou; ela povoou-o como se fosse uma religião natural e viva, com os seus mitos, suas legendas, seus encantamentos; insuflou-lhe sua alma infantil, suas tristezas sem pesar, suas lágrimas sem amargor…”.

Penso na primeira frase de Nabuco (a da escravidão como característica do Brasil) nesses dias em que o Congresso dá um primeiro passo para a superação da herança maldita. Não quero falar aqui sobre as conquistas legais para as empregadas domésticas, da nova lei sobre a qual os jornais tanto têm falado como num aviso: “patroas, cuidado: domésticas agora têm direitos”. Falo e penso nas empregadas que vi e tenho visto no Recife e em São Paulo. No aeroporto de Guarulhos eu vi Danielle Winits, a famosa atriz da Globo, muito envolvida com o seu notebook, concentradíssima, enquanto o filhinho de cabelos louros berrava. Para quê? A sua empregada, vestida em odioso e engomado uniforme, aquele que anuncia “sou de outra classe”, cuidava para que a perdida beleza da atriz não fosse importunada. Tão natural… os fãs de telenovelas não viam nada de mais na mucama no aeroporto, pois faziam gracinhas para o bobinho lindinho.

Em outra ocasião, numa terça-feira de carnaval à noite, vi no Recife uma jovem à minha frente, empenhada em ver a passagem de um maracatu. Tão africano, não é? Junto a ela uma senhora – desta vez sem uniforme, mas carregando no rosto e modos a servidão – abrigava nos braços um bebê. Os tambores, as fantasias, eram de matar qualquer atenção dirigida à criança, que afinal estava bem cuidada, sob uma corda invisível que amarrava a empregada. Então eu, no limite da raiva, oferecei o meu lugar à sua escrava sobrevivente, com a frase: “a senhora, por favor, venha com o seu filho aqui para a frente”. A empregada quis se explicar, coitada, morta de vergonha, enquanto a doce mamãe não entendia o chamamento irônico, pois me olhava como se eu fosse um marciano. Espantada, parecia me dizer: “como o meu filho pode ser dessa aí?”.

O desconhecimento de direitos elementares às empregadas domésticas (como privacidade, respeito, a falta de atenção para ver nelas uma pessoa igual aos patrões) creio que sobreviverá até mesmo à nova lei. É histórico no Brasil, atravessa gerações e atinge até mesmo os mais jovens e pessoas que se declaram à esquerda. É como se estivesse no sangue, como se fosse genético, de um caráter irreprimível. Até antes delas vão a democracia e a igualdade. A partir delas é outra história. Quantas vezes vemos nos restaurantes jovens casais com suas lindas crias, tendo ao lado as escravas, que nem sequer têm direito a provar da bebida e da comida? Isso nos domingos e feriados, pois esses são os dias das patroazinhas se divertirem. É justo, não é? O feminismo se faz para que mulheres sejam cidadãs, mas a cidadania só alcança os iguais, é claro.

Em todas as situações desconfortáveis, se ousamos estranhar, ou agir com pelo menos um olhar atravessado para essa infâmia, recebemos a resposta de que as domésticas são pessoas da família. Parentes fora do sangue, apenas separadas por deveres, notamos. É o que se pode chamar de uma opressão disfarçada em laços afetivos. A ex-escrava é considerada como um bem amoroso, íntimo, mas que por ser da casa come na cozinha e se deita entre as galinhas do quintal. O que, afinal, é mais limpo que se deitar com os porcos no chiqueiro. Não estranhem, porque não exagero. Não faz muito tempo, no Recife era assim. E por que estranhar esse tratamento? Olhem os grandes e largos e luxuosos apartamentos do Rio e de São Paulo, abram os olhos para os minúsculos quartinhos de empregadas, entrem nos seus banheiros, que Millôr dizia serem a prova de que no Brasil empregadas não têm sexo no WC.

Não posso concluir sem observar que os pobres copiam os ricos, e que o tratamento dado às domésticas se estende em democracia para todas as classes sociais. Menos para as empregadas, é claro. “A escravidão permanecerá por muito tempo como a característica nacional do Brasil”, dizia Nabuco.

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Urariano Mota é natural de Água Fria, subúrbio da zona norte do Recife. Escritor e jornalista, publicou contos em Movimento, Opinião, Escrita, Ficção e outros periódicos de oposição à ditadura. Atualmente, é colunista do Direto da Redação e colaborador do Observatório da Imprensa. As revistas Carta Capital, Fórum e Continente também já veicularam seus textos. Autor de Soledad no Recife (Boitempo, 2009) sobre a passagem da militante paraguaia Soledad Barret pelo Recife, em 1973, e Os corações futuristas (Recife, Bagaço, 1997). Colabora para o Blog da Boitempo quinzenalmente, às terças.


http://blogdaboitempo.com.br/2013/04/16/as-empregadas-e-a-escravidao/


Desassossego na cozinha

Patroas descobrem, aflitas, que as empregadas não aceitam receber salário-mínimo, querem seguro-desemprego, FGTS e não mais dormir no local de trabalho. Por que o espanto com a reviravolta dessas herdeiras da escravidão?


RUY BRAGA*
Se confiarmos no atual estado de desassossego dos bairros nobres da cidade, concluiremos que a luta de classes chegou às cozinhas. Patroas descobrem aflitas que as empregadas não aceitam mais receber um salário-mínimo. Além dos direitos garantidos, como férias de 20 dias úteis e vale-transporte, elas passaram a demandar o seguro-desemprego. Faltam braços e afloram comportamentos inusitados: suprema audácia, as domésticas requerem o depósito do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) e recusam-se a dormir no trabalho. Remanescente arquitetônico dos tempos da casa-grande, o cubículo dos fundos dos apartamentos paulistanos está lentamente mudando de serventia e vira depósito.

Eis a lamúria. No entanto, se deixarmos de lado as enraizadas disposições culturais da classe média alta, o momento atual do trabalho doméstico adquire tonalidades menos agudas. Em primeiro lugar, não é verdade que o aquecimento do mercado de trabalho brasileiro enfraqueceu a oferta de serviços domésticos. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, entre 1999 e 2009 o número de trabalhadores domésticos saltou de 5,5 milhões para 7,2 milhões. Aquietai-vos, patroas, pois o emprego doméstico segue firme como a principal ocupação nacional, acompanhado de longe pelo trabalho no telemarketing (1,4 milhões).

Na realidade, o baixo nível de desemprego, em torno de 5% da população economicamente ativa - índice mascarado pela grande participação do emprego formal precarizado -, elevou as expectativas dos trabalhadores subalternos. De fato, as empregadas estão mais exigentes. Mas, afinal, o que isso significa? Apenas que não aceitam trabalhar por menos de um salário-mínimo e meio, esperando alcançar direitos sociais já desfrutados pelos demais trabalhadores. Por que isso causaria assombro?

A razão é simples: no Brasil, o emprego doméstico é uma das mais antigas formas de trabalho assalariado, remontando ao período da escravidão. Assim, não é coincidência que, ainda hoje, mais de 60% da força de trabalho doméstica seja formada por negros. Além disso, cerca de 93% dos mais de 7 milhões de trabalhadores domésticos são mulheres. Elas são as genuínas herdeiras das escravas da casa-grande. Invisíveis à fiscalização do poder público, mesmo na principal metrópole brasileira, em 2009 apenas 38% das empregadas tinham carteira de trabalho. Em todo o País, a formalização do trabalho doméstico mal alcança os 30%.

Contribuem para esses números vexatórios a baixa escolarização e as enormes dificuldades autoassociativas inerentes ao processo de trabalho doméstico. Sem mencionar as tradicionais formas passivas de resistência “molecular”, como atrasos e faltas frequentes, ficaria surpreso se as empregadas não aproveitassem a atual correlação de forças existente no mercado de trabalho para exigir, além do pleno début na cidadania salarial, salários e condições de trabalho menos degradantes. Ao fazê-lo, elas apenas percorrem a trajetória histórica da classe trabalhadora: do campo para as cidades, atraída por direitos sociais, serviços públicos e oportunidades de profissionalização.

Em minha pesquisa de campo sobre os operadores de telemarketing, publicada recentemente no livro Política do Precariado: Do Populismo à Hegemonia Lulista (Boitempo), tive a oportunidade de entrevistar inúmeras filhas de empregadas que identificavam no contraponto ao trabalho doméstico - destituído de prestígio, desqualificado, sub-remunerado e incapaz de proporcionar um horizonte profissional - a principal razão de ter buscado o call center em vez de seguir os passos das mães - mesmo quando a diferença salarial era favorável ao emprego doméstico. No telemarketing, essas jovens perceberam a oportunidade de 1) alcançar direitos sociais e 2) terminar a faculdade particular noturna que o serviço doméstico, devido à incerteza dos horários, é incapaz de prover.

Mesmo que o ciclo do emprego no call center frequentemente frustre a esperança de progresso ocupacional - afinal, a rotatividade é muito alta e os salários, muito baixos -, ainda assim o telemarketing segue atraindo a fração mais jovem e escolarizada do grupo de domésticas. Como nesse setor a jornada de trabalho é de seis horas diárias e não há informalidade, a teleoperadora vive a oportunidade de alcançar direitos e terminar uma faculdade noturna.

Tomando pelo avesso a lamúria da classe média alta, é possível dizer que a preocupação das patroas prefigura um autêntico progresso social sumariado pela Proposta de Emenda à Constituição 478/10. Em trâmite no Senado, essa proposta iguala os direitos das empregadas aos dos demais trabalhadores com registro em carteira, assegurando jornada de trabalho de 44 horas semanais, FGTS, seguro-desemprego, horas extras e adicional noturno. Caso aprovada, seria um passo importante para a consolidação da precária cidadania salarial brasileira. E a luta de classes na cozinha teria cumprido parte de seu papel histórico.

*RUY BRAGA É PROFESSOR DO DEPARTAMENTO DE SOCIOLOGIA DA USP E AUTOR DE POLÍTICA DO PRECARIADO: DO POPULISMO À HEGEMONIA LULISTA (BOITEMPO)


http://www.estadao.com.br/noticias/suplementos,desassossego-na-cozinha,986356,0.htm



CURTAS


http://www.youtube.com/watch?v=cnGURbbtTlc - Electrodomestica


http://www.youtube.com/watch?v=U9mu2TJ0scY - Recife frio


http://www.youtube.com/watch?v=z0JjcpcKrCM - Novela avenida Brasil (Vingança de Nina com Carminha)

quarta-feira, 17 de abril de 2013

"PEC DOS EMPREGADOS DOMÉSTICOS"

PROPOSTA DE REDAÇÃO


A Proposta de Emenda à Constituição n.66 de 2012 (PEC 66), também conhecida como a “PEC dos empregados domésticos”, foi transformada em norma jurídica em 09 de abril de 2013 - Emenda Constitucional n. 72, que, “altera a redação do parágrafo único do art. 7º da Constituição Federal para estabelecer a igualdade de direitos trabalhistas entre os trabalhadores domésticos e os demais trabalhadores urbanos e rurais”, ou seja, eleva os empregados domésticos ao mesmo patamar de direitos das demais categorias profissionais.

Texto 1 - Conforme reportagem do jornal “Brasil de Fato” em 12 de abril de 2013, por Eduardo Maretti, da Rede Brasil Atual:

A aprovação, pelo Senado, da Proposta de Emenda Constitucional 66, a chamada PEC das Domésticas, amplia as garantias trabalhistas para a categoria que é formada em sua maioria (mais de 90%) por mulheres negras. A proposta será promulgada na próxima terça-feira. A PEC revoga o parágrafo único do artigo 7º da Constituição de 1988, dispositivo que enumerava direitos dos trabalhadores domésticos, mas que, na prática, retirava deles as garantias das outras categorias.
“Essa exceção, na época da promulgação da Constituição, já foi errada. Porque o empregado doméstico sempre foi um trabalhador como outro qualquer, que merecia todos os direitos de outros”, diz o professor Paulo Eduardo Vieira de Oliveira, da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP). “Nunca entendi essa exceção assegurando-lhes apenas alguns direitos. Isso é um resquício do tempo em que a trabalhadora doméstica era uma escrava que ficava dentro de casa, tinha obrigação de fazer tudo e estar à disposição do empregador o tempo todo sem receber por isso”, lembra Oliveira, que é também juiz do Tribunal Regional do Trabalho (TRT) da 2ª Região.
A PEC 66, ao revogar o parágrafo único do artigo 7° da Constituição, de acordo com o professor e magistrado, “apenas corrigiu um equívoco de 1988, e coloca essa categoria no mesmo patamar das demais, como sempre deveria ter sido”. Para a senadora Lídice da Mata (PSB-BA), relatora da proposta no Senado, a aprovação da PEC pelo Parlamento “responde à necessidade de modernização da sociedade brasileira, principalmente para garantir o direito dos que precisam dos direitos: quase 8 milhões de trabalhadores domésticos no Brasil”.
"Foi uma conquista de longos anos. O artigo 7°era uma discriminação do Estado contra essa categoria. Discriminava quando dizia 'exceto empregada domésticas'. A lei maior do país, que dizia que ninguém podia discriminar, nos discriminava. É uma contradição", diz a presidenta da Federação Nacional das Trabalhadoras Domésticas (Fenatrad), Creuza Maria Oliveira”.

Texto 2 - A Revista semanal “Veja” em sua edição 2315 de 03 de abril de 2013, traz o assunto como matéria de capa com a seguinte chamada: “VOCÊ AMANHÃ: As novas regras trabalhistas das empregadas são um marco civilizatório para o Brasil – e um sinal de que em breve as tarefas domésticas serão divididas entre toda a família”.
O título da matéria que se vincula a chamada, diz: “Nada será como antes”, e expressa, “como as famílias estão se reorganizando para se adaptar à lei que melhora a vida das empregadas domésticas, mas torna mais caros os seus serviços”. Conforme o texto introdutório:

Não, ainda não é o fim. Mas, sim, é certo que nada será como antes. As mudanças provocadas pela aprovação no Senado da PEC das Empregadas começarão nesta semana, quando quase 20 milhões de brasileiros que contam com os serviços de algum tipo de empregado em casa notarão a presença de um objeto estranho na mesa do café da manhã: o caderninho de ponto. Ele é, por enquanto, o recurso mais votado para ajudar patrões a controlar o tempo máximo que os empregados podem trabalhar por dia – ilimitado até a semana passada e a partir de agora fixado em oito horas pela Proposta de Emenda à Constituição que amplia os direitos trabalhistas das domésticas, babás, motoristas, caseiros, jardineiros e cuidadores de idosos. A nova lei vai mudar um bocado a rotina das famílias brasileiras. Mas não é só isso. Especialmente acreditam que ela terá reflexos no mercado de trabalho e vai alterar desde a implacável relação empregada-patroa até o bastante concreto setor de venda de eletrodomésticos. Para o bem e para o mal, a aprovação da PEC das Empregadas é um marco histórico para a sociedade brasileira. E uma oportunidade para o Brasil se livrar de uma poeira que há muito ficou sob o tapete.
No micro-univreso familiar, a mudança será tanto maior quanto mais dependente dos serviços dos empregados as famílias forem. Isso porque, de todas as novas regras, a que institui o pagamento da hora extra é a que tem maior potencial de causar um rombo no bolso do empregador. Enquanto o maior aumento médio no custo de uma empregada que trabalha até oito horas por dia não passa de 8%, o de outra, que cumpre uma jornada de duas horas a mais, chega a 72%.

Texto 3 - Segue na matéria da revista (Veja), a opinião da advogada paulistana Sonia Mascaro Nascimento, que não vê sentido numa jornada de trabalho mais rígida para empregada, como fixa a nova lei. Segundo a advogada: “Elas têm contato com a intimidade da família, é uma relação mais próxima e, portanto, flexível. Não dá para tratar como negócio”; “Não tem cabimento burocratizar a relação que tenho com alguém que vê TV comigo”.

Texto 4 - A Antropóloga Lúcia Arrais Morales, num artigo que trata do trabalho de faxineiras em um Campus universitário, sustenta sua análise por meio da compreensão da rotina de trabalho (o modus operandi) do cotidiano dessas trabalhadoras, conforme o trecho que segue:

O trabalho de faxina exige contato com dejetos humano e não humano. Além de tarefas classificadas como braçais, elas expõem o corpo do indivíduo a elementos poluídos e, em sendo assim, são duplamente desvalorizadas. A mulher que faz faxina tem que se curvar sobre vasos sanitários e com um escovão esfregar seus contornos e o seu fundo. Faz isto várias vezes e, ao inclinar seu tronco, sua cabeça também vai junta e seu campo sensorial, sobretudo seu olfato e visão, limita-se à forma-sanitário. Em cada uma das pias, ela usa uma esponja ou pano para friccionar sua superfície e o faz rápido e repetidamente. No interior das salas, ao usar a vassoura, dobra-se constantemente para tirar o pó embaixo de mesas, estantes e cadeiras. Isso sem falar de mais um item recentemente adicionado ao mobiliário das salas: o micro com seu teclado, CPU, mouse, almofadinha para o mouse e fios que se prolongam pelo chão. Além de uma vassoura, acrescentando peso à atividade, ela conduz um balde com água e nele mergulha um pano para executar outra operação: remover a poeira sobre os móveis.
Ela é ágil e atenta para não verter água em livros, computadores, telefones sem fio, ventiladores e tapetes. Todas estas ações têm de ser feitas até às oito horas da manhã, quando professores e funcionários iniciarão o expediente. Para tanto, elas começam às 6 horas da manhã. Isto significa que ela necessita acordar antes do sol nascer e a distância entre a sua residência e esse campus impõe submeter-se ao regime de um transporte coletivo. As faxineiras, objetos dessa pesquisa, são todas casadas e têm filhos. Isto implica que, além de repetir no ambiente doméstico essas mesmas tarefas realizadas aqui, ela acrescenta outras que também reclamam esforço físico como lavar e passar roupas. Afora isto, preparam a comida do dia seguinte para o marido e filhos. Portanto, sua jornada de trabalho é superior ao seu tempo de repouso”. (MORALES, Lúcia, A. – Faxineiras em um Campus Universitário, VII Seminário de Saúde do Trabalhador e V Seminário, O Trabalho em Debate “Saúde Mental Relacionada ao Trabalho”, 2010).


Texto 5 - Desigualdade e diferença são termos que correm nas entrelinhas das discussões postas acima. Entende-se que a desigualdade é o que pauta as relações sociais do trabalho no capitalismo, pois, uma enorme quantidade de despossuídos vende sua força de trabalho a uma minoria, que, por sua vez, detém condições suficientes para comprá-la. A diferença se encontra nas maneiras como trabalhadores e patrões entendem às relações sociais de trabalho. Porém, sobre os trabalhadores domésticos, pode-se argumentar serem eles trabalhadores como os outros, de outras categorias profissionais?




TEMA: Considerando os textos acima e as informações de que você dispuser, escreva uma dissertação-argumentativa, de no máximo 30 linhas, sobre o tema a seguir.

Em perspectiva, com base nos textos apresentados, é possível dizer que as alterações normativas sobre o trabalho doméstico é um marco civilizatório nas relações sociais desse tipo de trabalho no Brasil, ou seja, ele é trazido formalmente à modernidade liberal, significando o acesso aos direitos sociais fundamentais do trabalho. Contudo, é possível dizer também que trará mudanças na mentalidade comum do brasileiro sobre essa relação que remonta ao período escravista do país?



TEXTOS AUXILIARES:









Piercing
Zeca Baleiro

"Quando o homem inventou a roda
logo Deus inventou o freio,
um dia, um feio inventou a moda,
e toda roda amou o feio"
Tire o seu piercing do caminho
Que eu quero passar
Quero passar com a minha dor

Pra elevar minhas idéias não preciso de incenso
Eu existo porque penso
tenso por isso existo
São sete as chagas de cristo
São muitos os meus pecados
Satanás condecorado
na tv tem um programa
Nunca mais a velha chama
Nunca mais o céu do lado
Disneylândia eldorado
Vamos nós dançar na lama
Bye bye adeus Gene Kelly
Como santo me revele
como sinto como passo
Carne viva atrás da pele
aqui vive-se à míngua
Não tenho papas na língua
Não trago padres na alma
Minha pátria é minha íngua
Me conheço como a palma
da platéia calorosa
Eu vi o calo na rosa
eu vi a ferida aberta
Eu tenho a palavra certa
pra doutor não reclamar
Mas a minha mente boquiaberta
Precisa mesmo deserta
Aprender aprender a soletrar

Tire o seu piercing do caminho
Que eu quero passar
Quero passar com a minha dor

Não me diga que me ama
Não me queira não me afague
Sentimento pegue e pague
emoção compre em tablete
Mastigue como chiclete
jogue fora na sarjeta
Compre um lote do futuro
cheque para trinta dias
Nosso plano de seguro
cobre a sua carência
Eu perdi o paraíso
mas ganhei inteligência
Demência, felicidade,
propriedade privada
Não se prive não se prove
Dont't tell me peace and love
Tome logo um engov
pra curar sua ressaca
Da modernidade essa armadilha
Matilha de cães raivosos e assustados
O presente não devolve o troco do passado
Sofrimento não é amargura
Tristeza não é pecado
Lugar de ser feliz não é supermercado

Tire o seu piercing do caminho
Que eu quero passar
Quero passar com a minha dor

O inferno é escuro
não tem água encanada
Não tem porta não tem muro
Não tem porteiro na entrada
E o céu será divino
confortável condomínio
Com anjos cantando Hosana
nas alturas nas alturas
Onde tudo é nobre
e tudo tem nome
Onde os cães só latem
Pra enxotar a fome
Todo mundo quer, quer
Quer subir na vida
Se subir ladeira espere a descida
Se na hora "h"o elevador parar
No vigésimo quinto andar
der aquele enguiço
Sempre vai haver uma escada de serviço

Tire o seu piercing do caminho
Que eu quero passar
Quero passar com a minha dor

Todo mundo sabe tudo todo mundo fala
Mas a língua do mudo ninguém quer estudá-la
Quem não quer suar camisa não carrega mala
Revólver que ninguém usa não dispara bala
Casa grande faz fuxico quem leva fama é a senzala
Pra chegar na minha cama tem que passar pela sala
Quem não sabe dá bandeira quem sabe que sabia cala
Liga aí porta-bandeira não é mestre-sala
E não se fala mais nisso
Mas nisso não se fala
E não se fala mais nisso
Mas nisso não se fala
E não se fala mais nisso
Mas nisso não se fala
E não se fala mais nisso
Mas nisso não se fala




sexta-feira, 5 de abril de 2013

LEITURA RECOMENDADA


Zelig: um retrato da vida pós-moderna

Vinícius Soares PINTO

Pontifícia Universidade Católica do Paraná, Curitiba, PR

RESUMO

O presente artigo tem como objetivo analisar o filme Zelig (1983) – do diretor norteamericano Woody Allen – como uma obra cinematográfica capaz de representar elementos da realidade pós-moderna. A pesquisa começa com a identificação dos elementos que norteiam a Pós-modernidade, como o enfraquecimento das instituições, a sensação de uma vida vazia e efêmera, as crises de identidade do indivíduo e a espetacularização da vida do mesmo. Após esta fundamentação de conceitos que norteiam o modo de vida contemporâneo, o trabalho concentra-se na análise fílmica de Zelig, a partir de uma interpretação crítica entre o argumento da obra e as características da sociedade identificadas no início do trabalho.


PALAVRAS-CHAVE: cinema; pós-modernidade; Woody Allen; Zelig



http://www.intercom.org.br/papers/regionais/sul2011/resumos/R25-0239-1.pdf

LEITURA RECOMENDADA

‘Para a classe média, o que prevalece é o capital cultural’
Sociólogo vê sociedade perversa e diz que ‘brasileiro gentil’ é mito




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NICE DE PAULA (EMAIL)
Publicado:21/03/13 - 23h34

Para Jessé Souza, a ideia de classe média ‘condensa os sonhos de ascensão social’Marcelo Carnaval / Agência O Globo
RIO – Professor da Universidade Federal de Juiz de Fora, Jessé Souza estuda classes sociais há 20 anos e defende o uso de critérios além da renda. Na sua opinião, fenômeno recente foi a ascensão de uma ‘nova classe trabalhadora precarizada’

A sociedade brasileira é perversa?
Sim, porque o nível de desigualdade é enorme. O banqueiro na Avenida Paulista ganhar 500 vezes mais do que a pessoa que limpa a sua sala não é normal. E nós convivemos com essa perversão de forma muito natural e ainda temos esse mito brasileiro de que somos muito gentis.

O senhor discorda que exista uma nova classe média brasileira?
Este conceito está inserido na cegueira de pensar que as classes sociais se reproduzem apenas no capital econômico, quando a parte mais importante não tem a ver com isso, mas com o capital cultural, com tudo aquilo que a gente incorpora desde a mais tenra idade.

Quais são as classes sociais do Brasil?
Basicamente, quatro. A alta, que tem capital econômico. Tem a classe média, que não é tão privilegiada quanto a alta, mas se apropria de um capital cultural valorizado, saber científico, pós-graduação, línguas estrangeiras, um conhecimento que tem valor econômico. Essas duas são as classes do privilégio. Para a classe alta, o mais importante é o capital econômico, embora o capital cultural tenha uma função. E, para a classe média, o que prevalece é o capital cultural, embora algum capital econômico também seja necessário.

Quais são as classes “sem privilégios”?
As classes populares não têm acesso privilegiado a capital econômico, nem cultural nem social, não vão ter acesso a pessoas importantes. Têm que trabalhar desde cedo, são batalhadores. É essa a nova classe trabalhadora precarizada (chamada pelos economistas de “nova classe média”). Ela foi incluída porque tem um lugar no mercado, tem renda, planos e consumo de longo prazo, mas isso não a torna classe média. A outra classe “sem privilégios” são os muito pobres, que não têm nem precondição para aprender, a quem chamamos de maneira provocativa de ralé. Para as classes média e alta, é bom que exista a ralé, porque assim podem desfrutar de serviços que a classe média europeia e americana já não têm, como alguém para fazer a comida, cuidar dos filhos. É a luta de classes invisível, tipicamente brasileira.

Luta de classes?
As classes do privilégio economizam um tempo importante para estudo ou para um trabalho mais rentável, enquanto a ralé limpa sua casa, faz sua comida. Luta de classe é uma classe roubar tempo de outra. Quando a empregada deixa o almoço do filho da patroa pronto para ele estudar inglês em vez de preparar sua própria comida, esse jovem ou criança está usando seu tempo para reproduzir seu capital cultural. E a empregada, usando seu tempo para repetir sua condição social.

E por que haveria essa necessidade de inflar a classe média?
Porque é bom ser classe média. Ela inclui a noção indivíduos que são livres, são consumidores, cidadãos. Condensa os sonhos de ascensão social. Pertencer à classe média tem um efeito de distinção, como comprar um carro bacana, uma casa bonita.

O critério de renda não é importante?
É preciso estar atento às outras condições que formam um ser humano. Por exemplo, toda pessoa precisa ter confiança em si mesma. O filho da classe média pode se dedicar só ao estudo, é preparado desde cedo para ser vencedor. O filho da ralé já chega na escola como perdedor e a escola não é solução para tudo. Na nossa pesquisa, o que vimos não é que não tinha escola, mas as pessoas diziam: “nós ficamos fitando o quadro negro horas e horas sem poder aprender”. Se as pessoas não receberem os estímulos anteriores, a escola sozinha não vai resolver.

* Reportagem publicada no vespertino digital O GLOBO A MAIS


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