domingo, 27 de maio de 2012

ABORTO, ALÉM DO CERTO E ERRADO

A ética do aborto Por envolver noções de vida e morte, encerrar uma gestação não pode ser nos termos de certo ou errado, sugerem os filósofos. A possibilidade da decisão do STF no caso de fetos anencéfalos, mais uma vez adiada, reacende a discussão no Brasil Alcino Eduardo Bonella lEIA O ARTIGO NA ÍNTEGRA EM: http://filosofiacienciaevida.uol.com.br/ESFI/edicoes/65/artigo243394-1.asp?o=r

sábado, 26 de maio de 2012

PONTUAÇÃO EM TÍTULO DE REDAÇÃO

1) Em vestibulares, de um modo geral, o uso ou não de ponto final ou de outro sinal de pontuação não implica perda ou ganho de nota. Exemplos de tal afirmação podem ser obtidos, por exemplo, na leitura das redações nota 10 da Fuvest. 2) Em concursos públicos, a rigidez aumenta: um ponto final, por exemplo, colocado em frases sem verbos, ou seja, em frases que não constituam orações completas, implica perda de pontos na nota de redação.

sexta-feira, 18 de maio de 2012

PRÓXIMO TEMA: QUAIS OS CAMINHOS PARA RESOLUÇÃO DE MORTE MATERNA EM CASO DE ABORTO?

MATERIAL DE APOIO I) Textos: 1º) somos todas clandestinas- Tatiana Nascimento http://paradalesbica.com.br/2009/09/somos-todas-clandestinas/ 2º) Política feminista do aborto - Lucila Scavone: http://www.periodicos.ufsc.br/index.php/ref/article/view/9576/8803 3º)A questão do aborto no Brasil - Elisabeth Meloni Vieira: http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S0100-72032010000300001&script=sci_arttext II) Curta Animação: “Por todas nós” http://www.youtube.com/watch?v=rzq5M3cOAb0&feature=player_embedded. O nome da curta animação é "por todas nós"- sinopse: A curta animação cita últimos dados sobre o aborto no Brasil. Enquanto uma em cada sete brasileiras já fez aborto, a prática, sobretudo quando clandestina, continua sendo a 3ª causa de morte materna no país. Mulheres continuam sendo presas, humilhadas e maltratadas. É necessário impedir retrocessos no Congresso Nacional e garantir que propostas que criminalizam as mulheres não tenham avanços na sua tramitação. Há que fazer valer a legislação vigente e garantir atendimento humanizado em casos de aborto legal. Por fim, há que motivar o debate público para que seja possível uma reflexão sobre os direitos sexuais e reprodutivos das mulheres, inclusive sobre o direito de escolher com quem, quando e como ter suas filh@s. Está disponível para livre reprodução, desde que citados créditos. Link retirado do site (http://www.portodasnos.blogspot.com.br/). III) Cartilhas: 1ª) História da Maria do Céu na Terra - http://www.cfemea.org.br/index.php?option=com_jdownloads&Itemid=128&task=view.download&cid=11- História da Maria do Céu na terra é uma publicação pequena e leve composta por duas partes: A “História da Maria do Céu na terra” é narrada por meio de um conto que retrata visão de diferentes mulheres sobre a descriminação do aborto. Maria do Céu e as amigas falam sobre os problemas e expõem a conseqüente cumplicidade entre as mulheres que esse tabu cria.“Tudo bem conversarmos sobre aborto” apresenta a segunda parte que é composta por informações úteis sobre o tema, na secção intitulada “ Você sabia que?” 2ª) Vamos conversar sobre aborto? Conheça e defenda seus direitos! - http://www.cfemea.org.br/index.php?option=com_jdownloads&Itemid=128&task=view.download&cid=87 Esta publicação é uma versão reduzida da cartilha “SOS Direitos Reprodutivos: Conheça e defensa seus direitos sobre o acesso ao aborto”, pensada para servir de instrumento de informação e de defesa de direitos, especialmente direcionada às mulheres, aos movimentos feministas e de mulheres, e @s profissionais do direito que lhes prestam assessoria e apoio em situações de ameaça ou efetiva afronta à garantia de seus direitos reprodutivos.

Tema: “A construção de uma usina hidrelétrica causa efeitos negativos e positivos.”

As duas materias a seguir destacam os pontos positivos e negativos da construção da usina: essa defende a construção http://www.olharvirtual.ufrj.br/2010/?id_edicao=293&codigo=3 e essa se posiciona contra http://www.problemasambientais.com.br/impactos-ambientais/hidreletrica-de-belo-monte-impactos-ambientais/ Importante ressaltar que as usinas de Belo Monte, Jirau e Santo Antônio são usinas de fio d'agua, ou seja, geram energia de acordo com a vazante dos rios. Essas usinas não terão grandes lagos para possibilitar a represagem da água e uma geração de energia constante e perene. Nas cheias, elas produzirão no limite e terão geração menor, o que será compensado com as outras usinas do Sistema Interligado Nacional ou com a ativação emergencial de termelétricas. (Profº Luís)

Tema: “A construção de uma usina hidrelétrica causa efeitos negativos e positivos.”

O que são usinas hidrelétricas “a fio d’água” e quais os custos inerentes à sua construção? Ivan Dutra Faria1 (05/03/2012) Usinas hidrelétricas “a fio d’água” são aquelas que não dispõem de reservatório de água, ou o têm em dimensões menores do que poderiam ter. Optar pela construção de uma usina “a fio d’água” significa optar por não manter um estoque de água que poderia ser acumulado em uma barragem. Esta foi uma opção adotada para a construção da Usina de Belo Monte e parece ser uma tendência a ser adotada em projetos futuros, em especial aqueles localizados na Amazônia, onde se concentra grande potencial hidrelétrico nacional. Aliás, as usinas Santo Antonio e Jirau, já em construção no rio Madeira, são exemplos dessa tendência. Quais as consequências e custos inerentes a essa opção? Quais serão os problemas futuros que a decisão de abrir mão de reservatórios com efetiva capacidade de regularização de vazões poderá criar? Primeiramente, deve-se considerar que a energia “gerada” por uma hidrelétrica resulta da transformação da “força” do movimento da água. Transforma-se, assim, em energia elétrica, a energia cinética decorrente da ação combinada da vazão de um rio e dos desníveis de relevo que ele atravessa. Desse modo, não restam dúvidas de que, para o processo, guardar água significa guardar energia. Os sistemas de captação e adução levam a água até a casa de força, estrutura na qual são instaladas as turbinas. As turbinas são equipamentos cujo movimento giratório provocado pelo fluxo d’água faz girar o rotor do gerador, fazendo com que o deslocamento do campo magnético produza energia elétrica. O vertedouro, por sua vez, permite a saída do excesso de água do reservatório, quando o nível ultrapassa determinados limites. Outros aspectos e outros equipamentos são, também, importantes, mas, em qualquer caso, estaremos diante de uma busca por queda e vazão – a primeira, fixa, e a segunda, variável. Nesse processo de transformação, a geração de energia elétrica é limitada pelo produto entre vazão e altura de queda, pois a energia obtida é diretamente 1 Especialista em Avaliação de Impactos Ambientais de Barragens. Mestre e Doutor em Política, Planejamento e Gestão Ambiental. Consultor Legislativo do Senado Federal (Área de Minas e Energia). proporcional ao resultado dessa conta. A barragem interrompe o curso d’água e forma o reservatório, regulando a vazão. Em uma usina com reservatório, essa variável pode ser controlada pelos administradores da planta. Em uma usina a fio d’água, fica-se refém dos humores da natureza, ainda que com menor dependência que as eólicas. Hidrelétricas com reservatórios próprios são capazes de viabilizar a regularização das vazões. Devido à sua capacidade de armazenamento (em períodos úmidos) e deplecionamento (em períodos secos), elas atenuam a variabilidade das afluências naturais. Deve-se considerar, também, que esse mesmo efeito pode ser obtido com a construção de usinas “rio acima” – ou “a montante”, conforme o jargão técnico. Hidrelétricas instaladas em um mesmo curso hídrico podem atuar de forma integrada. Usinas localizadas “rio acima” – a montante, no jargão técnico – podem usar seus reservatórios para regular o fluxo de água utilizado pelas usinas localizadas “rio abaixo” – a jusante. A usina binacional Itaipu, por exemplo, por ser a última rio abaixo – a jusante, no jargão técnico – da Bacia do Rio Paraná, é considerada como a fio d’água. Ocorre que se a gigantesca hidrelétrica pode utilizar toda a água que chega ao reservatório, mantendo apenas uma reserva mínima para garantir a operacionalidade, tal diferencial se deve, direta ou indiretamente, à existência de dezenas de barragens a montante. O conjunto formado pelos potenciais hidráulicos da margem direita do rio Amazonas é considerado como uma rara e poderosa combinação de queda e vazão nos estudos de inventário hidrológicos de bacias brasileiras. A Volta Grande do Xingu, por exemplo, onde está sendo construída a hidrelétrica Belo Monte, apresenta uma queda de cerca de 90 metros entre dois pontos muito próximos de um rio cuja enorme vazão resulta de um percurso de milhares de quilômetros, iniciado no Planalto Central. Em geral, usinas a fio d’água têm baixos “fatores de capacidade”. O fator de capacidade é uma grandeza adimensional obtida pela divisão da energia efetivamente gerada ao longo do ano – em geral, medida em MWh/ano – pela energia máxima que poderia ser gerada no sistema.2 Trata-se, portanto, de uma medida da limitação da usina no que diz respeito à sua capacidade de gerar energia. Na Europa, esse fator situa-se entre 20% e 35%, em média, sendo um pouco maior na China e chegando a valores próximos a 45% nos EUA3. Em média, as hidrelétricas brasileiras têm fator de capacidade estimado em valores situados entre 50% e 55%. A regularização de vazões por meio do uso de reservatórios faz com que essa média suba significativamente, embora essa não seja, em muitos casos, a única responsável por isso. No rio São Francisco, por exemplo, esse número para Sobradinho é 51%, e para Xingó, mais a jusante, é 68%. No rio Madeira, a usina Jirau tem fator de capacidade próximo de 58%, e o número para a usina Santo Antônio é de 68%. Não por acaso, a vantagem relativa de Santo Antonio guarda forte correspondência com o fato de ser um projeto situado a jusante de Jirau. Pelas razões já apontadas, é possível compreender o magnífico número de 83% para Itaipu. No caso de Belo Monte a potência total instalada é de 11.233,1 MW e a geração anual média é de 4.571 MW, o que resulta em um fator de capacidade pouco maior do que 40%. Esse tem sido um dos pontos mais criticados pelos opositores ao empreendimento, que afirmam que a usina irá “gerar pouca energia”. Mas os argumentos utilizados, em geral, não levam em consideração dois pontos essenciais: os valores médios do fator de capacidade das hidrelétricas brasileiras e a principal razão pela qual o projeto de Belo Monte teve esse valor diminuído. Ainda que se considerasse Belo Monte como um projeto com fator de capacidade muito distante das médias das usinas brasileiras, deve-se levar em conta que o mesmo não ocorreria ao se compará-lo com aqueles situados na Amazônia e com as de outros países. Em Tucuruí, por exemplo, no rio Tocantins – diga-se de passagem, dispondo da regularização de usinas a montante –, esse valor é de aproximadamente 49%. 2 Essa energia é calculada por meio do produto Potência Nominal X 8760 h. Por sua vez, o número de horas anuais é calculado pelo produto 24h X 365 dias, ou seja, 8760 h. Não se deve confundir Fator de Capacidade com Fator de Carga, que é a razão entre a demanda média de energia elétrica, durante um determinado intervalo de tempo, e a demanda máxima registrada no mesmo período. Quanto maior esse índice, mais adequado é o uso da eletricidade. 3 Os valores médios de fatores de capacidade, em geral, não são muito precisos em razão da dinâmica do processo de implantação de novas usinas em cada país. Por exemplo, a entrada em operação ou a ampliação de um empreendimento pode alterar esses valores. Desse modo, os números aqui apresentados têm função apenas ilustrativa, visando a uma comparação que, de resto, é pertinente, uma vez que as possíveis variações não alteram substantivamente as possíveis conclusões. O reservatório projetado para Belo Monte foi diminuído, bem como inviabilizada a capacidade de regularização das vazões afluentes às suas barragens, em razão de argumentos de natureza ambiental. Além disso, houve a decisão de se elaborar um hidrograma denominado “de consenso”, com o objetivo de garantir que, a jusante do barramento, fossem asseguradas boas condições de pesca e de navegação às comunidades indígenas, entre outros aspectos. Evidentemente, regularizar ou não a vazão de um curso d’água é uma decisão que, necessariamente, deve incorporar a dimensão ambiental – numa escolha entre alternativas que devem ficar absolutamente claras para a sociedade. Entretanto, essa decisão vem sendo tomada sem o necessário amadurecimento, sem uma discussão ampliada, baseada em estudos objetivos dos benefícios e custos associados a tal escolha, com um exagerado receio de desagradar a grupos de pressão específicos e visando a uma boa imagem do governo na mídia. Aliás, justamente nos diversos meios de comunicação é possível encontrar os maiores disparates sobre o assunto. Nas informações divulgadas nesses meios há boas doses de lirismo, relacionado com a eventual substituição dos projetos de hidrelétricas, nomeadamente aqueles que preveem grandes reservatórios, em benefício de outras formas de transformação de energia – como as eólicas, por exemplo. Informações de baixa qualidade técnica, inclusive relacionadas à possibilidade de substituição de energia hidrelétrica por eólica, encontram eco entre os mais diversos operadores do direito e resulta em uma posição defensiva dos técnicos governamentais, tanto da área de energia quanto da área ambiental. Alguns dos argumentos mais utilizados nessa judicialização calcada na subjetividade são fundamentados no chamado “Princípio da Precaução”, que pode ser definido como de natureza filosófica, política, doutrinária, religiosa ou ideológica – mas, jamais como de natureza científica. O Princípio da Precaução é, essencialmente, um preceito que, se aplicado ao pé da letra, inviabilizaria o desenvolvimento, justificando a inação diante da ameaça de danos sérios ao ambiente, mesmo sem que existam provas científicas que estabeleçam um nexo causal entre uma atividade e os seus efeitos. Impõem-se, nesses casos, todas as medidas necessárias para impedir tal ocorrência. Pode-se dizer que há em tal raciocínio uma quase paródia do pensamento de Leibniz, pois em vez de se supor que nada acontece sem que haja uma causa ou razão determinante, a mera suposição causal (de um dano ambiental, nesse caso) determina que nada deva acontecer. Como acreditar que seja possível definir ameaça de danos sérios ao ambiente sem uma abordagem científica? Como definir ameaça, danos e sérios sem recorrer à ciência? Lamentavelmente, muitos atores políticos e operadores do direito crêem ser capazes de fazê-lo. No mundo real, a adoção rigorosa do princípio da precaução implicaria fechar todos os laboratórios científicos mundo afora. No Brasil, atualmente, sua aplicação faz com que um empreendedor tenha que provar que as intervenções previstas não trarão impactos, mitigáveis ou não, ao meio considerado, o que é virtualmente impossível. A militância radical, sustentada no Princípio da Precaução, está se utilizando de um raciocínio de mão única. A usina a fio d’água desperdiça a chance de se guardar energia da forma mais barata e da única forma que permite múltiplas utilizações da água armazenada como a criação de peixes, o turismo e a contenção de cheias, por exemplo. Em um pensamento predominantemente ideológico não há espaço para que sejam debatidas questões fundamentais acerca da opção única por usinas “a fio d’água” ou com reservatórios subdimensionados. Em primeiro lugar, deve-se considerar que o desperdício de capacidade produtiva de energia a montante da usina a fio d´água é praticamente irreversível. Em segundo lugar, a decisão por um caminho praticamente sem volta foi tomada sem o devido e necessário debate técnico e político acerca de um tema que afetará as próximas gerações. Não seria este o caso de se utilizar o princípio da precaução, evitando-se tomar uma decisão irreversível e de provável impacto ambiental negativo, visto que será necessário, no futuro, recorrer a fontes mais poluentes de energia para substituir a capacidade hidrelétrica desperdiçada? No Brasil, a capacidade de armazenamento de energia em reservatórios é intensamente beneficiada pela diversidade de ciclos pluviométricos das bacias brasileiras, um diferencial notável em relação a outros países. A otimização desses reservatórios passa pelas linhas de transmissão, que, na prática, funcionam como vasos comunicantes, transportando, em vez de água, energia de uma bacia hidrográfica que esteja em um momento de abundância de água, para outra, onde haja necessidade de se economizar água escassa. Desse modo, Belo Monte não pode ser entendida como uma usina isolada e, sim, como virtuosa e hidricamente intercomunicada – por ser interligada eletricamente – com o resto do País. Uma vez que o rio Xingu tem suas cheias quase dois meses depois das cheias dos rios das regiões Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste, a possibilidade de armazenamento em Belo Monte diminuirá fortemente os riscos de carência de energia – no jargão técnico, o risco de déficit. Os estudos de um projeto hidrelétrico incluem a análise do comportamento das estruturas, simulando a passagem de uma vazão superior a cheia decamilenar, ou seja, uma cheia de tempo de retorno de 10.000 anos. É tranquilizador saber que a margem de segurança de uma barragem é tão significativa. Todavia, esse cálculo não guarda qualquer relação com a segurança de vazões suficientes para fazer frente à influência da economia sobre a demanda por energia. Nesse caso, utilizam-se os cenários econômicos para estimar a demanda. Como a matriz de geração elétrica no Brasil há forte predominância hidrotérmica, os cenários começam a sinalizar a crescente necessidade de uso de energia de fonte térmica, mais cara e mais poluidora que a hidrelétrica. E o pior: “ovos de Colombo”, como a repotenciação e a modernização de hidrelétricas, ainda que totalmente defensáveis, não são processos capazes de garantir o acréscimo anual de 3.300 MW médios de energia que o Ministério de Minas e Energia considera necessário para fazer face às projeções de crescimento econômico para o Brasil. Difundir informações de que a implantação desses processos evitaria, por exemplo, a construção das usinas do rio Madeira não tem qualquer cabimento. O mesmo se pode dizer quanto à possibilidade de eólicas serem capazes de evitar a construção de novas hidrelétricas. Concordemos, então: a energia eólica é uma beleza, o Brasil deve investir cada vez mais nessa opção, há quem ache lindos os cata-ventos e os zingamochos – embora haja dúvidas quanto à reação da população de cidades que tenham que conviver próximas aos geradores, enfrentando a poluição visual e a descaracterização urbanística. Entretanto, essa não é uma opção para a base da matriz elétrica de qualquer país. Eólicas não são feitas para a geração de base, pois exigem complementação por meio de outras fontes, como hidrelétricas e termelétricas. Com fator de capacidade menor do que a média das hidrelétricas brasileiras, as usinas eólicas dependem fortemente dos ventos, pois essa opção tecnológica não permite armazenar a energia produzida. O crescimento do mercado consumidor de energia combinado com a implantação de usinas sem reservatórios diminui a confiabilidade do sistema, veda o aproveitamento múltiplo dos lagos das hidrelétricas e obriga o Operador Nacional do Sistema (ONS) a fazer um gerenciamento ano a ano dos estoques de água nas usinas. Como se sabe, sistemas elétricos imunes a defeitos ou a desligamentos imprevistos são modelos teóricos. Os 100% de confiabilidade no sistema elétrico ou “risco zero” de falhas implicaria elevar os custos, que tenderiam ao infinito. E o consumidor teria que pagar por isso, o que implicaria tarifas proibitivas. Assim, no mundo todo, algum risco de falha no sistema é aceito. Mas a redução no nível de confiabilidade do sistema interligado não é desprezível quando se reduz a capacidade de armazenamento de um sistema predominantemente hidrotérmico como o brasileiro. Quem deveria decidir se a opção pela construção de usinas a fio d’água é a melhor alternativa? Trata-se de um risco para o sistema, um erro inclusive do ponto de vista socioambiental e uma opção praticamente irreversível. Logo, constitui matéria a ser objeto de discussão por ampla representação da sociedade, e não apenas por ativistas ambientais, sociais, ideológicos ou do direito. Parece que alguém se esqueceu do art. 20, inciso VIII, da Constituição Federal, segundo o qual os potenciais hídricos são bens da União e não de meia dúzia de agentes públicos assustados com as ONGs, com a mídia e com os “achistas” de plantão. Se essa é uma discussão a ser feita pela sociedade e como seria inviável – embora defensável e desejável – a realização de um plebiscito acerca do tema, a democracia representativa tem a única resposta legítima para esse desafio: o Congresso Nacional. Para saber mais sobre o tema: Abbud, O. e Tancredi, M. Transformações Recentes na Matriz Brasileira de Geração de Energia Elétrica: Causas e Impactos Principais. Texto para Discussão nº 69. Núcleo de Estudos e Pesquisas do Senado, Senado Federal. Disponível em http://www.senado.gov.br/senado/conleg/textos_discussao/TD69- OmarAbbud_MarcioTancredi.pdf Montalvão, E. (2011). Ambiente e energia: crença e ciência no licenciamento ambiental, parte I. Núcleo de Estudos e Pesquisa do Senado Federal. Texto para Discussão nº 93. Disponível em http://www.senado.gov.br/senado/conleg/textos_discussao/TD93- EdmundoMontalvao.pdf Faria, I.D. (2011). Ambiente e energia: crença e ciência no licenciamento ambiental, parte II. Núcleo de Estudos e Pesquisa do Senado Federal. Texto para Discussão nº 94. Disponível em http://www.senado.gov.br/senado/conleg/textos_discussao/TD94- IvanDutraFaria.pdf Faria, I.D. (2011). Ambiente e energia: crença e ciência no licenciamento ambiental, parte III. Núcleo de Estudos e Pesquisa do Senado Federal. Texto para Discussão nº 93. Disponível em http://www.senado.gov.br/senado/conleg/textos_discussao/TD99- IvanDutraFaria.pdf Abbud, O. ; Faria, I.D. e Montalvão, E. (2011). Ambiente e energia: crença e ciência no licenciamento ambiental, parte IV. Núcleo de Estudos e Pesquisa do Senado Federal. Texto para Discussão nº 107. http://www.senado.gov.br/senado/conleg/textos_discussao/TD107- EdmundoMontalvao-IvanDutra-OmarAbbud.pdf. Faria, I.D. (2011). Entrevista à TV Senado (2011). http://www.senado.gov.br/noticias/tv/videos/cod_midia_64264.flv

quinta-feira, 10 de maio de 2012

ABORTO: POR UMA LEGISLAÇÃO A FAVOR DA VIDA

Frei Betto * O terapeuta se depara com o drama de mulheres que abortaram. Como religioso, solicitam-me aquelas que, diante de gravidez indesejada, sofrem a angústia da dúvida. Raramente vêm acompanhadas por seus parceiros - o que é preocupante sintoma. Em pleno século XXI questões sérias como o aborto são, ainda, consideradas tabus. Lamento as dificuldades que a Igreja Católica impõe à discussão. Se a teologia é o esforço de apreensão racional das verdades de fé, o teólogo tem o dever de manter-se aberto a todos os temas que dizem respeito à condição humana, mormente se encerram implicações morais. Embora contrário ao aborto, admito a sua descriminalização em certos casos e sou favorável ao mais amplo debate, pois se trata de um problema real e grave que afeta a vida de milhares de pessoas e deixa seqüelas físicas, psíquicas e morais. Ao longo da história, a Igreja nunca chegou a uma posição unânime e definitiva. Oscilou entre condená-lo radicalmente ou admiti-lo em certas fases da gravidez. Atrás dessa diferença de opiniões situa-se a discussão sobre qual o momento em que o feto pode ser considerado ser humano. Até hoje, nem a ciência nem a teologia tem a resposta exata. A questão permanece em aberto. Santo Agostinho (sec. IV) admite que só a partir de 40 dias após a fecundação se pode falar em pessoa. Santo Tomás de Aquino (séc. XIII) reafirma não reconhecer como humano o embrião que ainda não completou 40 dias, quando então lhe é infundida a "alma racional". Esta posição virou doutrina oficial da Igreja Católica a partir do Concílio de Trento (séc. XVI). Mas foi contestada por teólogos que, baseados na autoridade de Tertuliano (séc. III) e de santo Alberto Magno (séc. XIII), defendem a hominização imediata, ou seja, desde a fecundação trata-se de um ser humano em processo. Contudo, a discussão encerra-se oficialmente com a encíclica Apostolica Sedis (1869), na qual o papa Pio IX condena toda e qualquer interrupção voluntária da gravidez. No século XX, introduz-se a discussão entre aborto direto e indireto. Roma passa a admitir o aborto indireto em caso de gravidez tubária ou câncer no útero. Mas não admite o aborto direto nem mesmo em caso de estupro. Bernhard Haering, um dos mais renomados moralistas católicos, admite o aborto quando se trata de preservar o útero para futuras gestações ou se o dano moral e psicológico causado pelo estupro impossibilita aceitar a gravidez. É o que a teologia moral denomina ignorância invencível. Nem a Igreja tem o direito de exigir sempre de seus fiéis atitudes heróicas. Roma é contra a descriminalização do aborto baseada no princípio de que não se pode legalizar algo que é ilegítimo e imoral: a supressão voluntária de uma vida humana. A história demonstra, porém, que nem sempre a Igreja o aplicou com igual rigor a outras esferas, pois defende a legitimidade da "guerra justa" e da revolução popular em caso de tirania prolongada e inamovível por outros meios (Populorum Progresio). É o princípio tomista do mal menor. Em muitos países, a Igreja aprova a pena de morte para criminosos. Embora a Igreja defenda a sacralidade da vida do embrião em potência, a partir da fecundação, ela jamais comparou o aborto ao crime de infanticídio e nem prescreve rituais fúnebres ou batismo in extremis para os fetos abortados… É preciso encarar com seriedade as razões que induzem uma gestante ao aborto. A opção de abortar é moral e política. Pode ser encarada pelo ângulo do poder do mais forte sobre o frágil. Tão frágil que podem ser encontradas justificativas científicas para negar-lhe o título de humano. Para a genética, o feto é humano a partir da segmentação. Para a ginecologia-obstetrícia, desde a nidação. Para a neurofisiologia, só quando se forma o cérebro. E para a psicosociologia, quando há relacionamento personalizado. Em suma, o feto é uma espécie de subproletário biológico. Tão reduzido à sua impotência que não tem como protestar ou rebelar-se. Em muitos casos de aborto, o feto paga pela rejeição que a mulher tem ao homem que a fecundou ou pelos preconceitos que a atemorizam e a tornam tão escrava de conveniências sociais que, paradoxalmente, decide extraí-lo em nome de sua suposta liberdade. Liberdade que teme e da qual foge quando se trata de admitir uma relação adúltera, assumir-se como mãe solteira ou exigir de seu parceiro, ainda que casado com outra mulher, que se assuma como pai face à evidência de uma vida em processo. Há homens que, confrontados com uma inesperada gravidez, reagem com uma covardia inominável, como se o problema fosse apenas da mulher. E há mulheres coniventes com a omissão masculina, não raro por ter de optar entre o feto e o afeto... Partilho a opinião de que, desde a fecundação, já há vida com destino humano e, portanto, histórico. Sob a ótica cristã a dignidade de um ser não deriva daquilo que ele é e sim do que pode vir a ser. Por isso, o cristianismo defende os direitos inalienáveis dos que se situam no último degrau da escala humana e social. O debate sobre se o ser embrionário merece ou não reconhecimento de sua dignidade não deve induzir ao moralismo intolerante, que ignora o drama de mulheres que optam pelo aborto por razões que não são de mero egoísmo ou conveniência social. Trata-se de mulheres muito pobres que, objetiva e subjetivamente, não têm condições de assumir o filho; de prostitutas que dependem de seus corpos para sobreviver e dar de comer a seus dependentes; de casais que se deparam com uma gravidez imprevista que viria desestabilizar a vida conjugal e familiar; de mulheres mentalmente enfermas, incapacitadas para cuidar de uma criança; ou que engravidam involuntariamente após os 40 anos, quando aumenta a possibilidade de nascer um filho com deficiência. É a defesa do sagrado dom da vida que levanta a pergunta se é lícito manter o aborto à margem da lei, pondo em risco também a vida de inúmeras mulheres que, na falta de recursos, tentam provocá-lo com chás, venenos, agulhas ou a ajuda de curiosas, em precárias condições higiênicas e terapêuticas. Uma legislação em favor da vida faria este problema humano emergir das sombras para ser adequadamente tratado à luz do Direito, da moral e da responsabilidade social do poder público. O teólogo González Faus opina que "mais do que o moralista, a existência de situações-limites deve ser contemplada pelo legislador civil, que não está obrigado a assegurar toda a moralidade e sim a convivência pacífica, nem está obrigado a prescrever a heroicidade ou a procurar um "melhor" inimigo do bem, senão que muitas vezes há de contentar-se em evitar o mal maior. E é possível que, nas atuais circunstâncias de nossa sociedade, a descriminalização legal do aborto seja um mal menor." (Este es el hombre, Ed. Cristandad, Madri, 1986, p. 277). A morte clandestina no ventre elimina qualquer risco à propriedade e à imagem pública do proprietário. Para este, aliás, não há ilegalidade nesta matéria. Basta enviar a gestante a uma clínica particular e tudo se resolve. Mas como ficam as mulheres pobres que não podem ter filhos, senão sob o risco de perderem o emprego e deixarem a família na miséria? São inúmeras as que, para obter trabalho, se vêem obrigadas a esconder que são casadas e a impedir ou interromper a gravidez. Se os moralistas fossem sinceramente contra o aborto, lutariam para que não se tornasse necessário e todos pudessem nascer em condições sociais seguras. Ora, o mais cômodo é exigir que se mantenha a penalização do aborto. Mas como fica a penalização do latifúndio improdutivo e das causas que levam à morte, por ano, cerca de 26 entre cada 1.000 crianças brasileiras que ainda não completaram doze meses de vida? A descriminalização não reduz o número de abortos clandestinos. Muitas mulheres continuam a preferir o anonimato, para evitar danos à sua imagem social e/ou à do parceiro. Diminui é o número de óbitos em conseqüência do aborto. Em países onde o aborto não é criminalizado, inúmeras gestantes, ao procurar os serviços sociais decididas a fazê-lo, são convencidas a ter o filho - o que não ocorreria se vigorasse a criminalização. "No plano dos princípios" - declarou o bispo Duchène, presidente da Comissão Espiscopal Francesa para a Família - "lembro que todo aborto é a supressão de um ser humano. Não podemos esquecê-lo. Não quero, porém, substituir-me aos médicos que refletiram demoradamente no assunto em sua alma e consciência e que, confrontados com uma desgraça aparentemente sem remédio, tentam aliviá-la da melhor maneira, com o risco de se enganar" (La Croix, 31/3/79). Não se trata, pois, de legalizar o aborto, como se fez com o divórcio. Antes, de impedi-lo e defender os direitos da vida em embrião. Assim, uma legislação em favor da vida deve obrigar o poder público a promover amplas campanhas contra o aborto; esclarecer suas implicações morais, físicas e psicológicas; prever sanções aos empregadores que recusam mulheres casadas ou não dão suficiente apoio às gestantes; criar postos de atendimento às gestantes que pensam em abortar, onde médicos, psicólogos, assistentes sociais e, inclusive, ministros da confissão religiosa da interessada, procurem convencê-la a assumir o filho, demovendo preconceitos; ampliar a rede de Casas da Mãe Solteira, de modo a evitar que as gestantes solteiras sejam induzidas ao aborto por desamparo afetivo, moral ou econômico; assegurar o salário-maternidade e multiplicar o número de creches; criar o sistema telefônico de atendimento às mulheres angustiadas por gravidez imprevista, o SOS Futuras Mães; oferecer ajuda financeira às famílias que adotam crianças rejeitadas por suas mães etc. Em suma, assegurar o direito à vida do embrião e amparo moral, psicológico e econômico à gestante, bem como prescrever medidas concretas que socialmente venham a tornar o aborto desnecessário. (22.05.07 – MUNDO) Frei Betto é escritor, autor de "A mosca azul - reflexão sobre o poder" (Rocco), entre outros livros. Disponível em: http://www.adital.com.br/site/noticia2.asp?lang=PT&cod=27692. Acesso em: 12/10/2010.

quarta-feira, 2 de maio de 2012

RECOMENDAÇÃO DE LEITURA

Retrocesso Ambiental: Código Florestal maio 1, 2012 in Código Florestal | Tags: Agronegócio, Área de Preservação Permanente (APP), Bancada Ruralista, Biodiversidade, Biodiversidade Ameaçada, Biodiversity, Capitalismo, Código Florestal, Crime Ambiental, Deforestation, Descaso Ambiental, Desmatamento, Direito Ambiental, Flexibilização Ambiental, Florestas, forest, Insustentabilidade, Legislação Ambiental, Ministério do Meio Ambiente (MMA), Monocultura, Mudanças Climáticas, Política Pública, Reserva Legal (RL), Retrocesso Ambiental, Sustentabilidade Confira os principais pontos aprovados e rejeitados: APPs * extensão da Área de Proteção Permanente (APP) em torno de rios depende de sua largura, variando de 30 metros (para rios de 10 m) a 500 metros (para rios mais largos que 600 m); * manguezais passam a ser protegidos como APP; * imóveis rurais de até 15 módulos fiscais poderão praticar aquicultura se adotarem práticas sustentáveis de manejo do solo e da água. Precisará de licenciamento ambiental; * obras de defesa civil ou de segurança nacional, em caráter de urgência, não precisarão de licença do órgão ambiental nas APPs; * atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e turismo rural que já existiam em APPs até 22 de julho de 2008 poderão continuar e serão consideradas áreas consolidadas; * a recomposição de APP em rios de largura de até 10 metros nas áreas consolidadas poderá ser feita pela metade (15 metros); * os agricultores familiares e os proprietários de imóveis até 4 módulos poderão recompor a APP em torno de rios de até 10 metros tomando como limite total de APP o estabelecido para a reserva legal; * nas bordas de tabuleiros ou chapadas, topos de morros com inclinação média maior que 25°, áreas de altitude superior a 1,8 mil metros e encostas com declividade superior a 45° poderão ser mantidas atividades florestais, culturas de espécies lenhosas e infraestrutura de atividades agrossilvipastoris; * em área urbana de ocupação consolidada que abranja APP, a regularização fundiária de interesse social dependerá de projeto de elaborado na forma da Lei 11.977/09. Reserva legal * os índices de reserva legal continuam os mesmos do código atual: – 80% para imóvel em área de florestas na Amazônia Legal -35% para imóvel em área de cerrado na Amazônia Legal – 20% para imóvel em área de campos gerais na Amazônia Legal e nos demais biomas * a recomposição de reserva legal poderá ser feita com a regeneração natural da vegetação, pelo plantio de novas árvores (permitido o uso de até 50% de espécies exóticas) ou pela compensação; * a recomposição poderá ser feita em até 20 anos e as espécies exóticas poderão ser exploradas economicamente; * a compensação poderá ocorrer por meio de compra de Cota de Reserva Ambiental (CRA), arrendamento, doação ao Poder Público de área no interior de unidade de conservação de domínio público pendente de regularização fundiária, ou cadastramento de área equivalente no mesmo bioma; * imóveis com até 4 módulos fiscais poderão manter, a título de reserva legal, a área de vegetação nativa existente em 22 de julho de 2008; * quem desmatou respeitando os índices de reserva legal vigentes na ocasião está dispensado de recompor a reserva segundo os percentuais da lei; * para fins de recomposição, o Poder Público poderá reduzir a reserva legal para até 50% em áreas de floresta na Amazônia Legal se o imóvel estiver situado em município com mais de 50% da área ocupada por unidades de conservação públicas ou terras indígenas homologadas; * ouvido o conselho estadual de meio ambiente, o Poder Público poderá reduzir a reserva legal para até 50% em áreas de floresta na Amazônia Legal se o imóvel estiver situado em estado com mais de 65% do território ocupado por unidades de conservação públicas ou terras indígenas homologadas. Será preciso ter Zoneamento Ecológico-Econômico (ZEE); * os estados terão cinco anos para realizar e aprovar seu ZEE; * atividades na área de reserva legal desmatada irregularmente após 22 de julho de 2008 deverão ser suspensas imediatamente e o processo de recomposição deverá ser iniciado; * o manejo sustentável para exploração florestal da reserva sem propósito comercial e para consumo próprio não precisará de autorização, mas o limite será de 20 metros cúbicos por ano; * as APPs poderão ser usadas no cálculo da Reserva Legal se isso não implicar novos desmatamentos. Isso valerá para a regeneração, a recomposição e a compensação de reserva. Agricultura familiar . aos imóveis de agricultura familiar e com até 4 módulos fiscais permite-se computar, na manutenção da reserva legal, árvores frutíferas, ornamentais ou industriais; . o manejo sustentável da reserva legal não precisa de autorização se for para uso próprio, mas será limitado a 2 m³ por hectare ao ano e 15 m³ por propriedade ao ano; . pequenas propriedades poderão plantar culturas temporárias – como o arroz – em várzeas; . programas de apoio técnico e financeiro deverão ser criados para estimular os pequenos proprietários a preservar voluntariamente acima dos índices mínimos, proteger espécies da flora ameaçadas de extinção e recuperar áreas degradadas. Exploração florestal . o Plano de Manejo Florestal Sustentável (PMFS) deverá ter ciclo de corte compatível com o tempo de restabelecimento do volume de produto extraído da floresta; . empresas industriais que utilizem grande quantidade de matéria-prima florestal são obrigadas a elaborar o Plano de Suprimento Sustentável (PSS); . empresas siderúrgicas, metalúrgicas e outras que consumam grande quantidade de carvão vegetal ou lenha poderão usar madeira oriunda do PMFS; . para controlar a origem da madeira, o Ibama implantará um sistema de dados compartilhado com os órgãos ambientais dos estados; . a exportação de plantas vivas e outros produtos da flora dependerá de licença ambiental. Uso do fogo . o uso do fogo na vegetação passa a ter exceções: para peculiaridades locais justifiquem ou para atividades de pesquisa, ambos os casos com aprovação do órgão ambiental competente; e na queima controlada em unidades de conservação; . na apuração de responsabilidade pelo uso irregular do fogo, a autoridade competente deverá provar a relação entre a ação e o dano causado; . os órgãos ambientais deverão manter planos de contingência para o combate a incêndios florestais; . o governo federal deverá estabelecer uma Política Nacional de Manejo e Controle de Queimadas. Programa de apoio . o novo código autoriza o governo federal a instituir, no prazo de 180 dias de publicação da futura lei, um programa de apoio à conservação do meio ambiente; . o programa poderá fazer pagamentos em retribuição a serviços ambientais, tais como o sequestro de carbono, a conservação das águas e da biodiversidade, e a manutenção de APPs e Reserva Legal; . entre as compensações pela conservação ambiental poderão ser fornecidos crédito agrícola com taxas menores, linhas de financiamento para proteção de espécies ameaçadas e isenção de impostos de insumos e equipamentos (bombas d’água, fios de arame e outros); . os incentivos à recomposição de áreas desmatadas serão viabilizados por meio de recursos públicos a fundo perdido ou não, com a liberação de verba para pesquisa científica e tecnológica ligada à melhoria da qualidade ambiental, e pela permissão de deduzir no imposto de renda parte dos custos com o replantio; . os benefícios do programa de apoio não poderão ser concedidos a quem descumprir termos de compromisso do Programa de Regularização Ambiental (PRA); . as concessionárias de serviços de abastecimento de água e de geração de energia hidrelétrica deverão investir na recuperação e manutenção de vegetação nativa em APPs. Cadastro e regularização ambiental . o novo código cria o Cadastro Ambiental Rural (CAR), obrigatório para todos os imóveis rurais e destinado a integrar informações sobre a localização das reservas legais e das APPs; . a inscrição deverá ser feita no prazo de um ano, prorrogável por mais um; . a União, os estados e o Distrito Federal terão até dois anos de prazo, contados da publicação da futura lei, para implantar programa de regularização ambiental (PRA); . a União terá 180 dias para estabelecer regras gerais; . a inscrição no CAR é condição obrigatória para adesão ao PRA; . as multas por infrações ambientais cometidas até 22 de julho de 2008 serão suspensas desde a publicação da lei e enquanto o proprietário que aderiu ao PRA estiver cumprindo o termo de compromisso ajustado; . quando cumpridas as exigências do termo de compromisso ou do programa de regularização as multas serão convertidas em serviços de preservação do meio ambiente; . os PRAs deverão ter mecanismos que permitam acompanhar sua implementação, considerando as metas nacionais para florestas. Cota de Reserva Ambiental . o mecanismo de comprar cotas de reserva florestal para compensar reserva desmatada passa a ser chamado de Cota de Reserva Ambiental (CRA); . cada título representará 1 hectare de área com vegetação nativa primária ou de áreas em recomposição; . não poderá ser emitida CRA com base em vegetação nativa que seja parte de reserva legal exigida, mas apenas para o excedente; . a exceção é para a pequena propriedade, que poderá usar sua reserva legal para amparar a emissão da cota; . a cota somente poderá ser usada para compensar reserva legal de imóvel situado no mesmo bioma da vegetação vinculada à CRA. Principais dispositivos rejeitados . imóveis de agricultura familiar e os com até 4 módulos poderiam recompor pela metade a APP em torno de rios maiores que 10 metros, com um mínimo de 30 m e um máximo de 100 m; . conselhos estaduais de meio ambiente definiriam as extensões e os critérios para recomposição de APP em torno de rios maiores que 10 metros de largura para imóvel com área superior a 4 módulos; . imóveis dentro dos limites de unidades de conservação de proteção integral criadas até a data de publicação da futura lei não poderiam ter áreas consolidadas; . a carcinicultura e salinas em salgados e apicuns existentes até 22 de julho de 2008 poderiam ser mantidas se o empreendedor se comprometesse a proteger a integridade dos manguezais arbustivos adjacentes; . excluídas as ocupações consolidadas, cada estado poderia permitir a exploração de até 10% de salgados e apicuns no bioma amazônico, e até 35% nos demais biomas; . os empreendedores deveriam manter a integridade dos manguezais arbustivos, tratar os efluentes e resíduos, pedir licenciamento ambiental; . a licença ambiental desses empreendimentos seria de 5 anos e eles teriam de realizar Estudo Prévio de Impacto Ambiental (Epia) ou Relatório de Impacto Ambiental (Rima) se ocupassem área maior que 50 hectares; . quem desmatou ilegalmente vegetação nativa após 22 de julho de 2008 seria proibido de receber benefícios do programa de apoio; . quem não desmatou poderia contar com esses benefícios imediatamente e aqueles que estivessem cumprindo termos de compromisso de recomposição teriam de obedecer aos prazos do programa de regularização; . ao menos 30% dos recursos conseguidos com outorga pelo uso da água deveriam ser usados na manutenção e recuperação de APPs na respectiva bacia hidrográfica; . em áreas de preservação permanente ocupadas por atividades rurais consolidadas até 22 de julho de 2008 os proprietários teriam de recompor 30 metros de mata em torno de olhos d’água. Reportagem – Eduardo Piovesan Edição – Regina Céli Assumpção Fonte: http://www2.camara.gov.br/agencia/noticias/MEIO-AMBIENTE/415939-CONFIRA-OS-PRINCIPAIS-PONTOS-APROVADOS-E-REJEITADOS.html

terça-feira, 1 de maio de 2012

LEITURAS IMPORTANTES PARA O PRÓXIMO TEMA: REVITALIZAÇÃO OU HIGIENIZAÇÃO DOS CENTROS URBANOS BRASILEIROS?

ARQUITETURA E URBANISMO Revitalização, especulação ou higienização? Sexta-feira, 30 de setembro de 2005. A região central de São Paulo vem sendo palco de medidas polêmicas tomadas nos últimos meses pela prefeitura municipal. A mais recente é a construção de rampas com piso áspero na passagem subterrânea entre duas avenidas em São Paulo (Paulista e Dr. Arnaldo), que busca dificultar que moradores de rua lá se abriguem. A obra integra um conjunto de ações visando a revitalização do centro paulistano. Pesquisadores afirmam que, sob o pretexto da revitalização, está em curso um nítido processo de “higienização social”, mediante a expulsão da população pobre do centro. A construção de rampas com piso áspero na passagem subterrânea entre duas avenidas em São Paulo (Paulista e Dr. Arnaldo), que busca dificultar que moradores de rua lá se abriguem, teve como justificativa a diminuição de assaltos no local. A obra integra um conjunto de ações visando a revitalização do centro paulistano, palco de medidas polêmicas tomadas nos últimos meses pela prefeitura municipal. O debate acadêmico sobre essas modificações, que se dão de forma semelhante em várias partes do mundo, volta-se agora ao que se classifica como processo de gentrificação (enobrecimento) da região central da cidade. Reintegrações de posse de prédios ocupados por integrantes do movimento dos sem-teto (algumas envolvendo confrontos violentos entre moradores e polícia), intensificação da fiscalização contra comerciantes informais, tentativa de transferir catadores de lixo para fora do centro, desapropriação de imóveis na área conhecida como Cracolândia, e concessão de incentivos fiscais às empresas que lá se instalarem são algumas das medidas criticadas por pesquisadores das áreas de arquitetura, urbanismo e geografia. Eles afirmam que, sob o pretexto da revitalização, está em curso um nítido processo de “higienização social”, mediante a expulsão da população pobre do centro, e questionam a eficácia e a intenção dessas ações. Mariana Fix, pesquisadora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, avalia que há a clara intenção de mudança do perfil da população. “A gestão atual - diz ela -reafirmou várias vezes que a habitação social não faz parte do projeto de renovação da área central”. Programas de moradia para a população de baixa renda do centro estão entre as principais reivindicações do Fórum Centro Vivo (FCV), o qual a pesquisadora integra. Fundado em 2000, o FCV reúne grupos organizados dos movimentos populares urbanos, sindicatos, estudantes, pesquisadores de universidades, entidades de defesa de direitos humanos, cultura e educação, que são contrários à forma como a intervenção no centro está sendo implementada. “A linha central é de um projeto tradicional de revitalização de áreas centrais, marcado pela exclusão”, critica Mariana Fix. Já o engenheiro Marco Antônio Almeida, presidente executivo da Associação Viva o Centro (AVC), não vê esse caráter excludente na revitalização do centro. “Não se trata de obrigar ninguém a sair do centro, mas também não se deve incentivar a vinda deles (população pobre)”, defende ele. Surgida em 1991, a associação congrega principalmente empresários interessados nas modificações da região central. Para Almeida, as ações recentes da prefeitura paulistana atendem, em linhas gerais, o tipo de recuperação do centro defendido pela AVC. “O que falta ao centro é um sistema eficiente de gestão”, afirma o engenheiro. “O centro precisa ser melhor cuidado. Os problemas do centro são essencialmente questões de zeladoria e segurança urbana”, complementa. Ainda segundo o presidente da AVC, a região central de São Paulo caracteriza-se pela multifuncionalidade e diversidade, que devem ser preservadas e inclusive aproveitadas para fins turísticos. Em relação à população, Almeida defende que moradores de rua devem receber assistência social do poder público. Para aqueles que moram em prédios ocupados, a solução seria outra: “Existem áreas enormes a menos de mil e quinhentos metros do núcleo central, onde podem ser feitos conjuntos habitacionais de poucos andares”, sugere Almeida ressaltando que reformar prédios da área central para abrigar essa população não é uma alternativa adequada. Segundo ele, o alto custo de manutenção desses edifícios, com o qual os moradores não poderiam arcar, “ocasionaria novamente a deterioração e o risco de dominação por marginais”. Exemplo emblemático Segundo Mariana Fix, a região conhecida como Cracolândia, no centro de São Paulo, é ilustrativa das reais intenções das intervenções, na medida em que mescla interesses privados e uso do poder público. Em 1999, a inauguração da Sala São Paulo, parceria entre governo estadual e iniciativa privada para transformação da estação de trem Júlio Prestes em espaço para apresentações culturais, representou a tentativa inicial de promover modificações na região, estigmatizada pela deterioração e violência. “Os agentes do processo diziam que estavam promovendo um salto civilizatório na Cracolândia e que a inauguração da Sala não era simplesmente um equipamento cultural. O que de fato estava em jogo era um projeto de transformação do centro que incluía a regeneração do tecido urbano, a revalorização da área, e mais explicitamente, a retomada dos negócios imobiliários”, afirma a arquiteta. Para ela, o recente decreto municipal que declara 105 mil m2 da região como utilidade pública representa uma nova etapa do processo, no qual o poder público municipal desapropriará imóveis situados na área e tentará transformá-la em um pólo tecnológico. A arquiteta lembra ainda que a lógica que move a revitalização de áreas centrais deterioradas é evidenciada pelo geógrafo Neil Smith na obra As novas fronteiras urbanas: gentrificação e cidade revanchista (livro ainda não traduzido para português). Dentre muitos teóricos que analisam o fenômeno de gentrificação como algo presente na maior parte das cidades do mundo, Smith observa as regiões centrais de cidades norte-americanas a partir do pós-guerra, identificando um processo de especulação imobiliária. “Para o autor, o baixo custo das terras nessas áreas é considerado pelos investidores como potencial de gerar lucro, caso haja intervenção do poder público a partir de mudança no uso do solo ou grandes investimentos, por exemplo. Após a instalação das primeiras empresas eleva-se o preço da terra, gerando, na perspectiva dos investidores, um processo virtuoso de renovação”, explica a arquiteta. Segundo Fix, a promoção deste processo é o que pauta o projeto de revitalização do centro de São Paulo na atualidade. “No entanto, sua implementação no centro de São Paulo é, por razões históricas, dificultada, pois se formam ilhas dentro das regiões deterioradas”, afirma a arquiteta. Já o presidente da Viva o Centro discorda de que é a valorização imobiliária que se busca no processo de requalificação do centro. “O que se quer promover é justamente o oposto: aumentar o uso social das terras”. Segundo Almeida, São Paulo cresceu seguindo um planejamento inadequado, caracterizado pela expansão horizontal da cidade, alavancada pela especulação imobiliária. Para ele, trazer a população da periferia para áreas desocupadas mais próximas ao centro representaria um uso mais racional das terras e permitiria uma gestão mais eficiente da cidade. Assim, a proposta de recuperação do centro estaria inserida num projeto mais amplo para a cidade. Mariana Fix, contudo, não acredita que seja essa a intenção do atual projeto de requalificação do centro. “Há claramente uma disputa pelo uso da terra. A elite não abre mão que ali seja o centro da elite”, diz a arquiteta. “Tenta-se reafirmar que existe um projeto de convivência (entre diferentes segmentos da população), enquanto na prática o projeto é muito mais pautado pela violência”. Prós e contras da revitalização de centros urbanos Os projetos de recuperação e preservação de centros históricos, associados a processos de reestruturação urbana, têm sido uma constante no Brasil, principalmente a partir do final da década de 80 e início de 90. Pelourinho em Salvador, Bairro do Recife na capital pernambucana e o corredor cultural no Rio de Janeiro são alguns exemplos nacionais de locais que vêm sofrendo este tipo de intervenção. Barcelona, Nova Iorque, Boston, Manchester, Paris e Buenos Aires estão entre os exemplos internacionais que marcam o fenômeno mundial de revitalização ou remodelação urbana. Apesar de ocorridos em diferentes localidades e de possuírem peculiaridades, os projetos são semelhantes no fato de terem obtido investimentos vultosos em locais com grande potencial turístico, que abrigam interesses históricos e que, em períodos anteriores, tiveram um apogeu relacionado a uma atividade econômica específica. Certamente existem as mais variadas combinações entre o que deve ou não ser realizado na remodelação urbana, mas o fenômeno, no Brasil, é marcado por duas posições que mais se destacam no debate sobre o tema. Em linhas gerais, de um lado, defende-se a necessidade de reestruturação de centros urbanos dada a caracterização desses locais nos últimos anos pela violência, marginalidade, decadência das construções etc. Esse grupo afirma que investimentos do setor público e privado podem reverter esse quadro, tornando os locais mais atrativos, inclusive para novos investimentos, o que impediria que se iniciasse um novo empobrecimento após a recuperação. A principal aposta é na preservação do patrimônio histórico e nos investimentos culturais. De outro lado, acusa-se as iniciativas de revitalização dos centros urbanos de reproduzir um processo de "gentrificação", isto é, o enobrecimento de locais anteriormente populares. O resultado desse processo seria a produção de uma cidade desigual, com a expulsão da população de baixa renda das regiões revitalizadas em prol de interesses econômicos das elites, que se beneficiariam. Nessa visão, a cultura torna-se apenas um captador de investimentos, uma mercadoria em torno da qual formula-se (importa-se) um consenso sobre o que deve ser a cidade, financiado pelo capital privado e internacional. O professor Silvio Mendes Zanchetti, do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e a professora Norma Lacerda, diretora geral de urbanismo da prefeitura de Recife, avaliam a revitalização de áreas históricas como uma estratégia de desenvolvimento local. Segundo eles, em função do declínio da economia e da crise fiscal e financeira que caracterizou a economia no início da década de 80, o governo central desobrigou-se das políticas públicas, transferindo responsabilidades para outras instâncias, como os municípios. Nesse contexto, deixou-se de manter o modelo de investimentos em infraestrutura urbana e as prefeituras foram obrigadas a gerar recursos e elaborar novas estratégias de desenvolvimento. Para Zanchetti e Lacerda da UFPE, num mundo globalizado o que decide o jogo da competição por investimentos produtivos são as especificidades das localidades, sustentadas pelos atributos ambientais, culturais e históricos das cidades. "As antigas áreas urbanas assumem um papel importante na construção de políticas locais de desenvolvimento. São políticas de desenvolvimento voltadas, em geral, para a revitalização de áreas urbanas deprimidas, subutilizadas ou abandonadas, que perderam vitalidade econômica", dizem. Mas as questões sobre a revitalização urbana não encontram apenas esse tipo de avaliação. A professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP, Ermínia Maricato (veja artigo nesta edição), abordou outro ponto de vista durante a abertura da conferência "Cidades, populações urbanas" no segundo Fórum Social Mundial. A professora da FAU - USP apontou a disseminação de modelos internacionais de urbanismo, que atropelam condições ambientais e culturais específicas de cada sociedade, especialmente nos países periféricos" A crise econômica e financeira da década de 80 e a consequente transferência de responsabilidades do governo central para outras instâncias, apontadas por Zanchetti e Lacerda, são pensados a partir do desmonte do Estado provedor relacionado ao processo de globalização. As conseqüências disso são a perda de direitos sociais econômicos, a privatização de serviços públicos e o fortalecimento da ditadura do mercado, entre outras. Em "Cidade do Pensamento Único", os professores Ermínia Maricato, Carlos Vainer e Otília Arantes chamam atenção para esse processo. Arantes destaca ainda a mercantilização e a centralidade da cultura, num processo comandado pelo capital, que caracteriza os modelos europeu e americano de cidade-empresa-cultural importados pelo Brasil. Ainda segundo Ermínia Maricato, as cidades de países periféricos e semi-periféricos acabam, constituindo ilhas em determinados locais que mimetizam o Primeiro Mundo, onde residem os detentores do capital, cercados de "cidades ocultas" ignoradas pelo Estado. Para Carlos Vainer, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), os debates sobre revitalização de áreas urbanas, centros urbanos ou áreas históricas das cidades incorrem num grande equívoco. "A discussão está fundada na idéia de que estas áreas não possuem vitalidade. Na verdade, essas áreas têm uma extraordinária vitalidade, mas foram, em muitos casos, ocupadas por grupos sociais de baixa renda. O que está sendo feito é renegar um tipo de vitalidade e recuperar essas áreas para determinados grupos sociais", afirma ele. Vainer defende que o problema dessas áreas não é a de falta de vitalidade, mas a falta de investimento público, justamente porque são locais ocupados pelas camadas menos favorecidas. Ele contradiz a afirmação de que as classes de baixa renda não valorizam áreas históricas ou as áreas urbanas em que vivem. "A sobrevivência da riqueza patrimonial dessas regiões se deu graças aos grupos de baixa renda e não a outros. É como expulsar os índios da floresta para preservá-las, sendo que, graças a eles, ela ainda está preservada. Mesmo assim, retiram os índios e fazem reservas indígenas", diz ele. Outra acusação de Vainer é em relação às parcerias entre os setores público e privada, nas quais ocorre transferência de investimentos do primeiro para o segundo. "Se não fosse o investimento público, o investimento privado seria praticamente inviável. O público entra com o dinheiro e o privado com os benefícios decorrentes da valorização imobiliária e de projetos de natureza econômica", diz. Ele classifica como escandaloso o projeto Estação das Docas para revitalização da zona portuária da cidade de Belém, promovido pelo governo do estado. Segundo ele, o projeto construiu um shopping e restaurantes luxuosos, financiados com vinte milhões de reais do dinheiro público. "Um projeto que só se sustenta com dinheiro público e que é destinado à parcela mais rica da cidade de Belém", conclui. A revitalização do Bairro do Recife A revitalização do Bairro de Recife, apesar de suas peculiaridades, pode ser um exemplo do fenômeno de reestrutração urbana no Brasil e do embate que o cerca. O Bairro do Recife (ou Recife Antigo), situado no centro da capital pernambucana, margeado pelo mar e pelo rio Capibaribe, segundo avaliação dos professores Norma Lacerda e Sílvio Zanchetti, era considerado pela opinião pública, em 1986, uma das principais áreas-problema da cidade. As ruas e espaços públicos eram ocupados pelos ambulantes e, somada à degradação física das edificações e dos espaços públicos, deu à região o estigma de local perigoso e marginal. No entanto, essa mesma localidade foi o centro econômico da cidade do Recife do século XVII ao início do XX. Segundo Zanchetti e Lacerda, a partir de 1930, a região sofreu um processo de esvaziamento, devido ao deslocamento do centro econômico para o bairro de Santo Antônio, passando a abrigar cabarés, boates e prostíbulos. A expansão comercial e residencial para outras áreas, somadas a políticas públicas mal sucedidas e à crise da década de 80 culminaram, segundo eles, no deslocamento da população de baixa renda para o centro e a consequente proliferação de vendedores ambulantes e marginais. "Criou-se um círculo vicioso entre desvalorização imobiliária e a expansão das atividades de armazenagem. O Bairro tornou-se uma periferia central", dizem os pesquisadores. Várias foram as propostas de revitalização da área, mas o Plano de Revitalização do Bairro Recife (PRBR), na avaliação de Lacerda e Zanchetti, elevou a atratividade do bairro para o investimento privado e constituiu um exemplo de requalificação do patrimônio construído, demonstrando que as áreas históricas da cidade têm grande potencial de desenvolvimento, que deve ser ativado pelo poder público em parceria com atores econômicos locais. A implantação do plano começou, em 1993, com o governo municipal em parceria com vários agentes privados - como a Fundação Roberto Marinho e o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Em 1996, segundo os pesquisadores, o quadro de degradação da área estava completamente revertido. No entanto, essa não é a opinião de Rogério Proença Leite, pesquisador-associado do Centro de Estudos de Migrações Internacionais (Cemi) da Unicamp. "Parece-me válida qualquer intervenção que melhore as possibilidades de usos dos espaços públicos da cidade. Mas o que ocorreu no Bairro do Recife, caracterizou um processo de "gentrificação", acarretando forte exclusão social, na medida que espacializou as atividades de lazer do bairro, numa espécie de zoneamento da diferença", diz o pesquisador. Rogério Proença Leite aborda essa questão em sua tese de doutorado Espaço público e Política dos lugares, afirmando que é preciso questionar a quem se destinam as intervenções urbanas. "As cidades históricas têm em sua maioria forte apelo comunitário pelo que representam para a identidade cultural das pessoas. As intervenções deveriam contabilizar a necessidade de manter a dimensão pública dos espaços urbanos e promover ações que possam tornar mais democráticos os usos da cidade", afirma ele. A reforma certamente transformou a paisagem urbana de Recife, mas o pesquisador associa a mudança ao que ocorreu segundo ele, em Nova Iorque. "Na revitalização de Recife, antigas prostitutas foram removidas de suas casas e no local foram estabelecidos sofisticados bares e restaurantes - numa operação que relembra a experiência de limpeza social do Times Square. Hoje, o bairro transformou-se em um agitado ponto de encontro, com ampla visibilidade pública da cidade", aponta Rogério. As muitas vozes do centro Esse tipo de reforma urbana, que acaba excluindo a população pobre moradora de áreas a serem revitalizadas, vêm encontrando a resistência organizada da sociedade civil O Fórum Centro Vivo, fundado em dezembro de 2000, congrega movimentos populares urbanos, pastorais, universidades e entidades de defesa dos direitos humanos, educação e cultura em São Paulo. Surgiu em maio de 2000, durante o encontro "Movimentos populares e Universidade", organizado por estudantes da USP, pela Central dos Movimentos Populares (CMP) e pela União dos Movimentos de Moradia (UMM). Segundo Mariana Fix, arquiteta, pesquisadora da FAU-USP e participante do Fórum, o objetivo é articular as pessoas e grupos que lutam pelo direito de permanecer no centro da cidade de São Paulo, contrapondo-se ao processo de renovação urbana e exclusão que vem ocorrendo. Entre outras ações, destaca-se o envio de propostas de reformulação e debate do Plano Reconstruir o Centro, da prefeitura de São Paulo. De acordo com sua carta princípios, o Fórum busca fortalecer as lutas sociais em prol do uso democrático do espaço público, garantindo a ampla acessibilidade ao centro, combatendo as formas de segregação social e defendendo a função social da propriedade, contra a especulação imobiliária. A idéia de defesa da preservação da história e da memória também está presente entre os princípios do Fórum, mas como patrimônio vivo, e portanto, contra a sua monumentalização e museificação. Essa visão choca-se com algumas posições adotadas pela Associação Viva Centro, fundada em São Paulo, em 1991, por entidades e empresas vinculadas à região. A associação defende a reformulação do centro de São Paulo visando inseri-lo de forma competitiva no conjunto das "cidades mundiais". Para a Viva Centro, o centro de São Paulo é o local privilegiado de cultura, história e desenvolvimento urbano da metrópole e é entendido como potencial alternativa para a reorganização funcional e espacial da metrópole que, com padrões de eficiência e qualidade, pode passar a abrigar as principais corporações e organizações nacionais e supranacionais. Júlia Andrade, geógrafa e participante do Fórum Centro Vivo, analisou as intervenções urbanas em São Paulo em "Da Cultura da Intervenção à Intervenção da cultura", afirmando que a idéia de São Paulo como uma cidade mundial advém da reinvenção de seu centro sustentada por uma coalizão inédita de parcerias público-privadas. Segundo ela, nesse processo, a cultura torna-se uma peça central no processo de valorização e ocupação da terra urbana. Júlia Andrade explica que, sob o signo de investimentos ou intervenções culturais, cria-se um consenso em torno da necessidade de se fazer essas intervenções e mobilizam-se uma série de interesses da iniciativa privada e dos governos locais para reativar o turismo de negócio ou outros negócios ligados a cultura. "O discurso do governo e do BID associa diretamente cultura e economia. Como consequência das intervenções a população local que vivia naquelas regiões antes degradadas, vai sendo direta ou indiretamente expulsa, muitas vezes sem indenização", afirma Júlia Andrade Para Carlos Vainer, a esfera da cultura também é encarada nesse processo como uma esfera econômica. "Temos como exemplo a abertura de um Museu Guggenheim no Rio de Janeiro. O Guggenheim exporta franquias para vários lugares como uma cadeia de fast foods. Um vende comida, o outro vende exposições", afirma Vainer. A cidade, para ele, passa a ser um espaço relevante, pois é o locus onde determinado conjunto de eventos e atividades do mercado cultural atualizam-se e alteram-se como espetáculo. "Quase sempre isso acaba operando como um mecanismo de homogeinização artística e cultural que asfixia manifestações culturais tradicionais. Instalado um mercado cultural, vige nele, como nos outros mercados, as regras da competência, do capital acumulado, em que apenas os maiores têm capacidade de competição", afirma Vainer http://www.comciencia.br/reportagens/cidades/cid02.htm

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Enviado por Guilherme Freitas - 06.08.2011| 08h10m. Carlos Vainer discute megaeventos e 'cidade de exceção' Desde os anos 1990, as sucessivas candidaturas do Rio a sede das Olimpíadas são justificadas com alusões ao caso de Barcelona, que promoveu um amplo processo de revitalização urbana por ocasião dos Jogos de 1992. Apoiadas por consultores catalães, autoridades cariocas investiram pesado na concorrência global para receber o megaevento, até atingirem o objetivo. Em entrevista ao GLOBO por telefone, o urbanista Carlos Vainer, professor do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional (Ippur) da UFRJ, argumenta que o desejo de “vender” a imagem do Rio nesse mercado simbólico faz a cidade operar como uma empresa, onde a publicidade mascara as contradições sociais e o debate é silenciado pela necessidade de aproveitar a “oportunidade de negócios” trazida pelo megaevento. O caso das Olimpíadas de Barcelona (1992) costuma ser citado como exemplo do uso de um megaevento para alavancar a recuperação de uma cidade. Que condições permitiram o sucesso do projeto na época? CARLOS VAINER: Quando se transforma uma experiência específica em modelo, é preciso ter cuidado para não desenraizá-la das condições históricas em que aconteceu. Na época em que o projeto de Barcelona foi feito, a Espanha estava entrando na União Europeia e recebeu dotações milionárias que respaldaram aquele processo na cidade. Além disso, era o momento de redemocratização da Espanha, a nova Constituição reconhecia a autonomia de províncias como a Catalunha, e estava no poder em Barcelona um partido socialista que tinha compromisso com os movimentos sociais locais. Tudo isso favoreceu a recuperação da cidade, inclusive do ponto de vista dos recursos financeiros. Mas hoje Barcelona também é objeto de críticas. Há uma grande desigualdade social na cidade, embora ela tenha agora uma área nobre que virou cartão-postal, como o Rio tem a Zona Sul. Há uma controvérsia na academia e nos movimentos sociais catalães sobre as consequências da hegemonia desse modelo competitivo adotado por Barcelona. Como esse modelo pode ser definido? CARLOS VAINER: É a transposição para a esfera pública de modelos de gestão e competição empresariais. A cidade passa a ser vista como uma empresa, que compete com outras cidades-empresa no mercado internacional. A cidade é reduzida a uma das suas dimensões, a econômica, e mesmo assim a apenas uma das faces dessa dimensão econômica, que é a empresarial. E a partir do momento em que se pensa a cidade como empresa, ela também passa a ser vista como mercadoria: como eu posso “vender” minha cidade para o mundo? É desse pressuposto que se desenvolve o marketing urbano, e Barcelona tem hoje o melhor do mundo, adotado como modelo pelo Rio. Porém, esse, como qualquer marketing, opera com uma perspectiva redutora da realidade: se você quer “vender” o Rio no exterior, não vai mostrar favelas, pobreza nem desigualdade. O marketing torna invisível tudo que não é uma virtude da mercadoria. Como a mobilização em torno do megaevento influencia a identidade de uma cidade? CARLOS VAINER: O megaevento age como um catalisador desse modelo, porque concentra toda a cidade num único símbolo. Segundo a sociologia urbana, a cidade se define por três aspectos: tamanho, densidade e diversidade. Isso é uma cidade: um lugar onde há muita gente, junta e diversa. Reduzir a cidade a uma única dimensão, seja a mulher bonita de Ipanema ou uma paisagem da Zona Sul, é esconder a diversidade, é a negação da cidade. A cidade-empresa torna invisíveis as diferenças, porque ela vende não o que ela é, e sim o que quer parecer. É um processo simbólico que tem consequências concretas, como no caso das remoções no Rio. Cria-se a utopia de uma cidade sem pobres, mas os pobres existem nesta cidade. O que fazer? A solução encontrada é: mandar para longe esse elemento que corrompe o ideário da cidade perfeita. Só que esse ideário é irreal no Rio, porque a cidade está fundada sobre uma sociedade profundamente injusta. Como a construção dessa imagem para consumo externo influencia a imagem que a cidade tem de si mesma? CARLOS VAINER: Assim como há um marketing para fora, há um marketing para dentro. Produz-se uma autoimagem que também silencia parte da cidade. Numa cidade-empresa, é necessária a união de todos em torno de um objetivo comum, o que acaba eliminando a diversidade e o debate. O suposto consenso em torno desse objetivo comum restringe a discussão sobre o futuro da cidade. Quando alguém pergunta se devemos gastar tanto dinheiro com as Olimpíadas em vez de resolver o saneamento de uma cidade onde 40% dos domicílios não tem esgoto, ou por que fazer transporte público para a Barra da Tijuca, que não representa nem 20% das viagens diárias do Rio, em vez de para a Baixada e Niterói, que respondem por quase 80% das viagens, isso é tratado como traição ao objetivo comum. O megaevento é visto como uma oportunidade de negócios, e não se dá espaço para discussão, porque é preciso aproveitar a oportunidade. Quais podem ser a consequências de se encarar o megaevento sobretudo como “oportunidade de negócios”? CARLOS VAINER: A criação do que eu chamo de “cidade de exceção”. O megaevento gera toda uma legislação ad hoc, específica e casuísta, para aproveitar a oportunidade de negócios. A regra coletiva, pública, sucumbe diante de uma sucessão interminável de exceções: regime diferenciado de contratação, isenção tributária para hotéis, isenção fiscal e alfandegária para parceiros do COI... Uma das leis aprovadas permite que os municípios se endividem com obras para a Copa acima da Lei de Responsabilidade Fiscal. Ou seja, não se pode superar o orçamento para fazer um hospital ou uma escola, mas para fazer um estádio, sim. Os municípios estão se endividando, e não se discute o que isso vai provocar nos próximos 10 ou 15 anos em termos de orçamento público. Nesse quadro, o que pode ser feito para que os megaeventos dessa década deixem, de fato, um legado positivo para o Rio? CARLOS VAINER: A informação tem que circular. A sociedade precisa saber quais são os projetos, quanto custam e que impacto terão sobre o orçamento público hoje e amanhã. Precisa haver um controle social dos gastos. A maior parte dos investimentos para esses eventos é dinheiro público entregue a instituições privadas. Que retorno esse investimento terá? Cita-se muito o exemplo de Barcelona, mas outras Olimpíadas, como a de Atenas (2004), foram catástrofes. Montreal até hoje paga dívidas das Olimpíadas de 1976. Também precisamos debater o planejamento da cidade. Por que parte da população tem que ser removida para a periferia? O argumento principal do governo é de que os terrenos no Centro são caros, mas temos a área portuária, onde cerca de 80% da terra é pública. Por que não aproveitar esse espaço para habitações de interesse social, em vez de entregá-los à iniciativa privada? A imprensa sempre criticou a “cidade partida”, mas estamos aprofundando esse problema com as remoções, e isso é silenciado. Se a cidade é o lugar da diversidade, é necessário que coexistam, próximos uns aos outros, diferentes grupos sociais. Temos que impedir que se construam guetos, tanto dos pobres, com as remoções, quanto dos ricos, nos condomínios de luxo. http://oglobo.globo.com/blogs/prosa/posts/2011/08/06/carlos-vainer-discute-megaeventos-cidade-de-excecao-396846.asp