domingo, 17 de fevereiro de 2008

A arte de revisar um texto


A arte de escrever e de revisar um texto

Fazer e desconfiar do que fizemos. Refazer e desconfiar do que refizemos. Rascunhar e rascunhar... É assim que chegamos, enquanto escritores, à redação que queremos: totalmente clara e compreensiva. E chegamos “cortando”.
“Escrever é cortar. A velha e boa definição bem que poderia ter tido origem no método de Graciliano Ramos. Como escritor, ele tinha dois trabalhos: fazer e desfazer o texto. (...) Quando não havia mais uma vírgula que pudesse ser jogada fora, o livro estava pronto.”
Em geral, os rascunhos de nossos textos contêm mínimas correções e pouco se diferenciam do texto definitivo. São rascunhos “prontos”! E isso ocorre porque revemos nossos textos com uma leitura rápida e pouco crítica, em vez de realizarmos uma revisão como se deve.
Citamos Graciliano Ramos. E Machado de Assis? Será que também fazia da revisão um passo fundamental para a produção de seus textos. Vejamos
um trecho da primeira redação pública (estampada na Gazeta de Notícias de 13/7/1884) e a redação definitiva (na 3ª edição em livro – Várias histórias, 1904) de “O enfermeiro’: (1ª) redação - “(...) tendo eu quarenta e dois anos [apareceu-me um emprego. Creio que era o quadragésimo. Eu, desde que deixei (por vadio) o curso de medicina, no segundo ano, fui todas as cousas deste mundo, entre outras, procurador de causas, mascate da roça, cambista, boticário e ultimamente agora era] teólogo, - quero dizer, copiava os estudos de teologia de um padre de Niterói, antigo companheiro de colégio, que assim me dava, delicadamente, casa, cama e mesa.”; (2ª) redação - “No ano anterior, ali pelo mês de agosto, tendo eu quarenta e dois anos, fiz-me teólogo – quero dizer, copiava os estudos de teologia de um padre de Niterói, antigo companheiro de colégio, que assim me dava, delicadamente, casa, cama e mesa.”
Quarenta e uma palavra a menos! Também Machado de Assis, grande escritor, submetia seus textos à revisão para suprimir trecho de todo irrelevante para o objetivo central do escritor (no texto acima: insinuar certo cinismo da personagem ao contar que, aos 42 anos de idade, vivia à custa de um padre amigo, a troco de copiar para este os seus estudos de teologia).
Em suma, a arte de escrever só se completa com a arte de revisar.

Nenhum comentário: